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CINEMA/ESTREIAS
José Belmonte se despede do caos
O diretor de "Se Nada Mais Der Certo" diz que, depois de quatro filmes sobre vidas no limite, está em busca da leveza
"A crise estética do cinema brasileiro é, também, uma crise financeira", diz diretor; de seus quatro longas, apenas dois foram lançados
ANA PAULA SOUSA
DA REPORTAGEM LOCAL
José Eduardo Belmonte cansou de ser cult. Depois de quatro longas-metragens filmados
e só dois lançados, o cineasta
resolveu tirar do foco a crise para tentar, ele próprio, sair da
crise. Ele parece até ter se inspirado no título do seu filme.
"Se Nada Mais Der Certo" haverá, ainda assim, uma saída.
"O caminho que percorri foi interessante, mas quero, a partir
de agora, fazer filmes mais leves, sem tanto desespero. Quero rir", afirma, sério.
Belmonte diz que, além de
rir, deseja alcançar, de fato, os
espectadores. Seu quarto filme
estreia hoje sem que o primeiro, "Subterrâneos" (2003), e o
terceiro, "Meu Mundo em Perigo" (2007), tenham chegado ao
circuito comercial. Apenas "A
Concepção" (2005) conseguiu
saltar os muros dos festivais. "É
ótimo ganhar festivais. Mas cinema não é só isso."
O cineasta saiu com troféus
debaixo do braço dos festivais
do Rio, de Brasília e do Ceará.
Mas a aura de cult, segundo ele,
também cansa. Autor de um cinema que busca, na própria forma de narrar e mover a câmera,
expor os desequilíbrios do
mundo, Belmonte faz filmes
tão instigantes quanto imperfeitos. Não à toa, com os prêmios e alguns afagos da crítica,
vieram também as pedras.
"Alguém escreveu que "Concepção" era um desfile de genitálias. Outro me chamou de débil mental. Os distribuidores
que viram "Meu Mundo..." não
quiseram lançar o filme por
achá-lo triste", enumera.
Ele admite, porém, que esses
filmes eram uma busca pessoal
-talvez radical. "Fiz tudo em
esquema de cooperativa, com
dinheiro de amigos. Vou tentar
ser mais abrangente, alcançar
outro público. "Se Nada Mais..."
já busca um diálogo maior."
O filme que estreia hoje tem,
inclusive, Cauã Reymond como
protagonista. O galã global surge na tela desempregado e desnorteado, dizendo que "só os
idiotas estão seguros neste
mundo". Todos, no filme, têm
vidas no limite. A personagem-síntese é a andrógina Marcim
(Caroline Abras) que, mesmo
flertando com o crime, acessa o
mundo pela porta do afeto.
"Pode parecer uma ode ao
ressentimento, mas não é. É
um olhar em crise sobre a crise", define Belmonte.
"Esse clima de desespero e
urgência é um pouco fruto da
situação financeira", prossegue. "Se eu tivesse um processo
de trabalho mais tranquilo, sairia outro tipo de filme. A crise
estética do cinema brasileiro é,
também, uma crise financeira."
Belmonte está convencido de
que o modo de produção transformou o cinema nacional num
"doente crônico". "É tão difícil
fazer um filme que ninguém
quer correr o risco de errar."
Para o próximo projeto,
"Billy Pig" -aquele que o fará
rir-, ele juntou-se à produtora
Vânia Catani, que fez os filmes
de Selton Mello e Matheus
Nachtergaele. "Quero me profissionalizar. Forcei um pouco
a barra até aqui. Mas, com quase 40 anos, acho que as coisas
podem ser mais simples."
"Se Nada Mais..." ainda é da
fase da complicação. Mas, por
trás do travo amargo, o filme
guarda muito afeto e certa graça. A trilha sonora, com canções de "Os Saltimbancos", talvez seja a senha da passagem de
Belmonte agoniado para o Belmonte de "Billy Pig", que terá
um porco de pelúcia falante.
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