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DISCO LANÇAMENTOS
"Geração sertão" ganha reedições cruciais
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local
Chega de volta, numa daquelas
séries econômicas, o grosso da
história da música nordestina estilizada/"popificada" que se impôs no final dos anos 70, decaiu
nos 80 e vive, nestes 90, uma onda
já duradoura de revalorização.
Os artistas contemplados, alguns dos mais importantes dessa
leva, são Zé Ramalho, Geraldo
Azevedo, Elba Ramalho e Fagner.
A série, da Sony, chama-se "Geração Nordeste"; no site de venda de
discos da gravadora na Internet,
cada um dos 17 títulos custa módicos R$ 6,63.
O lado ruim da coisa vem daí:
como a justificar o pouco preço,
produzem-se reedições de nível
inferior aos piratas de camelô
-capas horrendas e adulteradas
(há uma reprodução das originais
na contracapa, de impressão surrada como nem o mais infame piratão faria), fichas técnicas indecentes. E depois ainda passam lição de moral contra pirataria...
Ainda assim -infelizmente assim-, valem ouro as reedições,
pois reexpõem uma das últimas
movimentações grupais de personalidade a que o Brasil pós-tropicalista assistiu. O mais sortudo é
Zé Ramalho, com seus nove primeiros discos relançados.
Aqui se viaja das maravilhas
agrestes de "Zé Ramalho" (78,
com "Avohai", "Vila do Sossego",
"Chão de Giz"), "A Peleja do Diabo com o Dono do Céu" (79, com
"Admirável Gado Novo", "Frevo
Mulher") e "A Terceira Lâmina"
(81) à perda de fogo nos ainda
dignos "De Gosto, de Água e de
Amigos" (85), "Opus Visionário"
(86), "Décimas de um Cantador"
(87) e "Frevoador" (92).
Entre uma ponta e a outra, estão
pequenas surpresas esquecidas,
em "Força Verde" (82, que marca
o início do "inferno astral" de Zé,
sob uma acusação de plágio),
"Orquídea Negra" (83) e "Por
Aquelas Que Foram Bem Amadas
ou Pra Não Dizer Que Não Falei
de Rock" (84).
Esse último é um quase manifesto pelo rock brasileiro, ao qual
afinal o artista nordestino fora
sempre pregado. São definidoras
as participações de Wanderléa e
Zezé Motta, juntas numa faixa, e
de Erasmo Carlos, numa versão
de "The Fool on the Hill", obra-prima dos Beatles. O rock de Zé
era feito de Luiz Gonzaga, Beatles,
jovem guarda e "afro-Brasil"
-muito incomum, não?
Notáveis, também, são os volumes dedicados a Geraldo Azevedo e Elba Ramalho -apenas um
título de cada um deles, mas representantes dos melhores momentos de suas carreiras.
"Bicho de 7 Cabeças" (79), de
Geraldo, é um tratado de delicadeza agreste, de flertes com o sublime em "Táxi Lunar" (parceria
com Zé Ramalho e Alceu Valença), "Bicho de 7 Cabeças 2" (cantada com Elba) e "Arraial dos Tucanos" (composta para a trilha do
"Sítio do Picapau Amarelo").
Elba, em 1980, época de "Capim
do Vale", era uma gritaria só, intérprete descontrolada jorrando
ansiedade criativa. Mas era uma
legítima intérprete de raiz, extensiva e espantosa na pesquisa de
ritmos, gêneros e compositores.
"Capim do Vale" é um songbook da secura do sertão: há flagrantes acesos de Elomar ("O
Violeiro"), Zé Ramalho ("Banquete de Signos"), Vital Farias (a
genial "Veja"), Bráulio Tavares
("Caldeirão de Mitos"), Sivuca e
Paulinho Tapajós ("Capim do
Vale"), Mirabô e Capinan ("Fulô
da Margem"), mais, claro, Luiz
Gonzaga ("Légua Tirana", "Imbalança"). Nossa.
Fagner, por fim, é o canto mais
doído da geração sertão. Aqui está o épico "Orós" (77) -em que
canta "Cebola Cortada" e não faz
concessão comercial qualquer-,
mas é privilegiada a fase anos 80,
gritada e popularesca, em detrimento dos primeiros anos.
Assim, é de se contentar com
"Beleza" (79), o latino "Traduzir-Se" (81), "Palavras de Amor" (83),
"A Mesma Pessoa" (84) e a coletânea "Entre Amigos", quase nunca
relevantes.
No geral, reaparece no horizonte a ponta do iceberg de uma geração ainda encarada com certa reticência. Continuam submersos
(e perdidos por gravadoras várias) Ednardo e o Pessoal do Ceará, Vital Farias, Elomar, Belchior
-e, na própria Sony, a muito injustiçada Cátia de França, cantora
e compositora de primeira. Um
dia todo o gelo derrete.
Coleção: Geração Nordeste (17 títulos)
Artistas: Zé Ramalho, Geraldo Azevedo, Elba Ramalho, Fagner
Lançamento: Sony
Quanto: R$ 6,63 cada título, na loja virtual da Sony (www.sonymusicstore.com.br)
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