São Paulo, quinta-feira, 14 de setembro de 2006

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Pianista acusa Neschling de furtar música

Ex-parceiro musical do maestro, Ilan Rechtman diz não ter recebido o crédito pelo tema do programa "Roda Viva"; Neschling rebate as acusações

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

O maestro John Neschling e o pianista Ilan Rechtman eram tão próximos que compuseram duas músicas a quatro mãos -as trilhas do filme "Desmundo" e da novela "Esperança".
Agora, Rechtman revela que compôs pelo menos uma música que Neschling diz ter feito sozinho: a do programa "Roda Viva", da TV Cultura. "Escrevi a música sozinho, mas Neschling apresentou-a à TV Cultura como se fosse dele", diz à Folha.
Inimigo do maestro desde que foi demitido da direção do Concurso Internacional de Piano Villa-Lobos, em abril, o pianista, que admitiu ter adulterado a nota de um jurado, começa a revelar os bastidores da mais importante orquestra brasileira, a Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo). Diz que a Osesp não é transparente e que orquestras com um orçamento anual similar (R$ 57 milhões) pagam o dobro a seus músicos.
Rechtman, 43, um israelense que já tocou com a Orquestra de Londres, trabalhou com o celista Yo-Yo Ma e já teve composições regidas por Zubin Mehta, conta que os CDs da Osesp, gravados pelo selo Bis, são pagos com dinheiro público, mas o lucro da venda fica para a empresa sueca.  

FOLHA - Que tipo de relação o sr. tinha com John Neschling?
ILAN RECHTMAN
- Conheço John Neschling há quase cinco anos. Tivemos uma relação tanto pessoal quanto profissional. Escrevemos juntos a trilha para o filme "Desmundo" e a música da novela "Esperança". Iniciei uma série de concertos de música de câmara na Sala São Paulo que tem sido um sucesso nesses últimos anos.

FOLHA - Como o sr. foi escolhido para ser o diretor do concurso?
RECHTMAN
- Comecei a trabalhar no concurso de piano em abril de 2005. Seis meses antes Neschling me pediu que escrevesse a música de abertura do programa "Roda Viva", o que fiz, mas nessa época ele evitou me pagar ou até me dar créditos. Escrevi a música sozinho no estúdio da minha casa, mas Neschling apresentou-a à TV Cultura como se fosse dele.
Apesar de vários pedidos meus, ele nunca me deu crédito nem me compensou por isso. Em março de 2005, eu o encontrei para almoçar e toquei no assunto e também disse a ele que iria começar uma nova série de música de câmara fora da Sala São Paulo. Ele não gostou da idéia, pois provavelmente sentiu que essa nova série competiria com aquela que eu dirigia na Sala São Paulo. Ele me pediu para esperar duas semanas.
Quando achei que iria me compensar pelo trabalho do "Roda Viva", ele me ofereceu o cargo de diretor do concurso. Disse que eu tinha três horas para pensar na proposta. Aceitei porque me envolvi em concursos internacionais por mais de 20 anos como candidato e júri.

FOLHA - Por que o sr. não processou Neschling por essa música?
RECHTMAN
- Não o processei porque ele me deu a direção do concurso. Não me sentia à vontade para processá-lo. Nem sei se o farei agora. O problema é que minha mulher trabalha como violoncelista da Osesp. Mesmo sem um processo judicial, as coisas estão ficando muito desconfortáveis para ela.

FOLHA - Um orçamento de R$ 2,3 milhões não é alto para um concurso internacional de piano?
RECHTMAN
- Claro que é. Neste ano foram realizados 300 concursos internacionais de piano, e o da Osesp é provavelmente o mais caro. Não entendo para onde foi esse dinheiro. Quando comecei a trabalhar no concurso, me disseram que eu tinha US$ 100 mil para a publicidade internacional. Logo depois, um novo administrador disse que eram US$ 25 mil. Cerca de US$ 70 mil foram reservados para publicidade local, mas parece não terem sido usados. Quando pedi um telefone para fazer ligações para fora do Brasil, levou quase um ano.
Fiz todas as ligações internacionais do concurso de minha casa. Nunca me deram um escritório. Levou dez meses para me darem uma mesa. Quando pedi um armário para colocar os formulários dos candidatos, eles me disseram que não poderia tê-lo. Acho que o público deveria saber como o dinheiro foi gasto.


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