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26ª BIENAL
Obras de oito artistas da África trazem tradição do retrato do continente
Fotógrafos africanos contrapõem escola alemã
EDER CHIODETTO
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Na miscelânea de obras de arte
abrigadas sob o tema "Território
Livre", da 26ª Bienal Internacional de São Paulo, está incluída a
mostra de fotografia africana, baseada quase totalmente na forte
tradição do retrato existente no
continente.
A diáspora causada pela escravidão, as diversas etnias e a conflituosa divisão geopolítica do continente africano são alguns dos fatores que fizeram com que o retrato se estabelecesse como uma
importante vertente para a pesquisa etnológica. Pelo retrato são
fixados os traços étnicos e as marcas pessoais, além dos costumes e
da cultura de uma população em
conflito com sua identidade.
Para Simon Njami, o curador
responsável pela edição do trabalho dos oito fotógrafos africanos
-dos quais apenas quatro estão
vivos- de sete países diferentes,
o tema "Território Livre" deve ser
interpretado como uma metáfora: "Não necessariamente se referindo apenas a espaços físicos
mas também, mentais e psicológicos. Cabe a nós construirmos os
espaços de liberdade que desejamos. Os espaços que não pertencem a ninguém também se chamam terra de ninguém. Nesse
sentido, a África toda é uma terra
de ninguém, no que diz respeito à
política e à economia internacional. A África está ameaçada, mas
parece que ninguém se importa".
Os retratos africanos, embora
soem como um corpo estranho
dentro do pavilhão da Bienal,
pautado pela arte contemporânea, servem de contraponto para
as "fotografias de registro" que
dominam a maior parte dos trabalhos em fotografia e têm no alemão Thomas Struth seu mais influente representante.
Essa fotografia de registro, realizada com apuro técnico e ampliada em grandes dimensões, se assenta sob o conceito da captação
do mundo visível com a menor
interferência possível do fotógrafo na cena, o que gera um certo
vazio pela frieza da abordagem.
A mostra africana, ao contrário,
se estrutura a partir da paisagem
humana, revelada nas faces de várias gerações. Aqui a direção de
cena e a interação entre fotógrafo
e fotografado é de vital importância. "Trata-se de uma abordagem
inédita e radical do retrato", diz o
curador-geral, Alfons Hug, que
morou por três anos na Nigéria,
nos anos 80.
O retrato clássico que era realizado entre os anos 50 e 60, em
preto-e-branco, feito em estúdio
com fundo neutro, como nas fotografias de Abderrame Sakaly
(1926-1988), Mama Casset (1908-1992) e Cornelius Augustt Azzaglo (1924-2001), foi retomado pela
contemporânea Eileen Perrier,
mas desta feita utilizando fundos
coloridos na frente dos quais as
pessoas são retratadas dentro de
suas casas.
Detalhe: o fundo de tecido não
cobre toda a área da imagem, deixando entrever objetos da decoração, entre os quais muitos retratos
de família fixados nas parede. Ao
mesmo tempo em que reverencia
a tradição, Eileen Perrier faz avanços na direção da ironia e da metalinguagem.
O mesmo avanço, porém, não
se percebe nos auto-retratos de
Samuel Fosso ou nas imagens de
edificações abandonadas de Otobong Nkanga, entre outros trabalhos, que findam por enfraquecer
a unidade da mostra.
26ª BIENAL INTERNACIONAL DE SÃO
PAULO. Onde: pq. Ibirapuera (av. Pedro
Álvares Cabral, s/nº, portão 3, tel. 0/xx/
11/5574-5922). Quando: seg. a qui.: 9h
às 22h. Sex. a dom.: 9h às 23h. Até 19/ 12.
Entrada franca.
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