São Paulo, quinta-feira, 14 de dezembro de 2000

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TEATRO

Diretor estréia peça de Apuleio

Paroni encena metáfora dos excluídos na Escócia



DA REPORTAGEM LOCAL

Um dos clássicos da literatura greco-romana, "O Asno de Ouro", do escritor Apuleio (125-170 d.C.), serve como metáfora teatral para refletir a relação exploradores-explorados no mundo contemporâneo.
A perspectiva é adotada pelo diretor brasileiro Maurício Paroni de Castro, que adaptou o título para "O Jegue de Ouro", em português, e estréia a montagem hoje no Tron Theatre, em Glasgow, na Escócia, com a companhia local Suspect Culture. Paroni assina a direção com Graham Eatough.
Português, latim, italiano e inglês: os personagens se expressam em várias línguas. Castro, que vem de mais de uma década atuando no Centro di Ricerca per il Teatro (CRT), em Milão, revezando com montagens brasileiras, como a recente "Restos Humanos Não-Identificados - A Verdadeira Natureza do Amor", no Rio, recorre à desterritorialização das línguas para expor as contradições que permeiam os 11 capítulos da obra de Apuleio.
"A época de Apuleio, no século 2 depois de Cristo, representava o máximo da expansão do Império Romano, que não permitia a propagação do latim", afirma Paroni, 38. "Hoje, o português também é uma língua periférica diante do império norte-americano, do domínio do inglês por meio da Internet, por exemplo."
Em "O Jegue de Ouro", o protagonista Lúcio (interpretado pelo ator italiano Sérgio Romano) tem dificuldades para comunicar seus sentimentos na língua oficial, "um mecanismo de exclusão".
Burro ou jegue, não é por acaso que o título alude aos animais estigmatizados pela submissão. Os quadros são costurados pelo protagonista que, graças a uma feitiçaria, perdeu sua condição humana e se tornou um quadrúpede.
Lúcio queria se transformar em coruja, para viajar e encontrar a terra das magias, mas uma troca entre os potes de unguentos resultou na metamorfose indesejada. O que em princípio não o preocuparia (bastava-lhe comer pétalas de rosas para voltar a ser o que era) descambou para uma verdadeira comédia de erros.
Recolhido em uma estrebaria, logo após a transformação, o jegue e outros dois animais são levados por bandidos que matam seu dono. A aventura culminará em narrativas como a do Amor e Psiquê, matriz de fábulas que atravessaria os séculos.
A estrutura cenográfica do espetáculo é formada por sucatas, a partir de material recolhido nas ruas por jovens e idosos integrados aos Gorgals Community, órgãos do governo voltados para a população carente.
Participam do projeto o pintor italiano Gianpaolo Kohler, a designer italiana Laura Trevisan, o músico escocês Nick Powell, a assistente social escocesa Sarah Eatough e a tradutora brasileira Sylvia Soares. A temporada é curta, até o próximo dia 23. Paroni quer trazer o espetáculo para o Brasil em 2001. (VALMIR SANTOS)


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