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OSCAR 2000
"Orfeu" e Diegues merecem homenagem hoje
GERALD THOMAS
especial para a Folha
Desta vez vai ser diferente. Em
vez de me contentar em ler a longa lista das indicações nos jornais
do dia seguinte, dessa vez vou estar grudado na televisão hoje pela
manhã, sintonizado na Academia
de Cinema de Los Angeles, fazendo qualquer tipo de promessa e
rezando todo o tipo de reza para
que Cacá Diegues esteja incluído.
É evidente que não dou importância qualitativa ao Oscar. É evidente que o jogo político e a quantidade de pequenos subornos e
protocolos sociais cumpridos
acabam determinando o consenso que dá no prêmio.
E, como ainda respeito, acima
de qualquer outra coisa, o conceito de que o artista tem de ser um
revolucionário, sei que deveria
nutrir um certo desprezo por todas essas "avaliações especializadas". Aliás, como diz o próprio
Cacá, "o prêmio é um acidente na
vida do artista, atrapalha seu processo criativo e compromete sua
arte com os valores mais medíocres". Mas o fato é que hoje pela
manhã estarei nervoso e emocionado, sim.
Para mim, o fato de "Orfeu" ser
ou não indicado não é o que está
em jogo. O que me emociona é a
esperança de que o artista e pensador Cacá Diegues possa estar
sendo homenageado, revertendo
o quadro atual pouco audacioso,
pouco inteligente, modista e raso
por que passa a indústria cinematográfica mundial.
Eu gostaria que esse artigo e entrevista fossem lidos como uma
homenagem a esse amigo brilhante, que tem me iluminado
com sua obra e com sua generosidade desde que comecei a conceber a idéia de ser um artista de
teatro. A importância de sua obra
está em sua paixão explícita pela
brasilidade antropofágica, alucinante, lúcida e assumidamente
contraditória.
Cacá é um autor de hinos. Seus
filmes expressam todo o civismo,
a beleza e a tristeza da história
desse país. Sua utopia é a mais bela de todas as utopias. Seus sonhos, assim como seus filmes, são
os mais belos hinos compostos
por um artista.
Nos vemos sempre que o tempo
permite. Dessa vez, nos encontramos em seu escritório no Leblon,
no dia quente e confuso em que
retornava de uma longa estadia
em Los Angeles. Uma única coisa
estranha aconteceu durante o encontro: assim que mencionei o
nome de Glauber Rocha, o rádio
começava a tocar a quinta bachiana de Villa-Lobos, tema de "Deus
e o Diabo na Terra do Sol".
Ficamos com os olhos inundados e, naquele momento, percebi
que "Orfeu" representa muito
mais que um belíssimo filme -e
que premiá-lo significaria abraçar
e beijar o próprio Glauber e todo
esse magnifico legado que lida
com a identidade artística mais
autêntica que esse país já produziu.
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