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TEATRO
Montagem carioca de "O Avarento", comédia de Molière, chega hoje a SP
Jorge Dória cria cacos de avareza
VALMIR SANTOS
FREE-LANCER PARA A FOLHA
Ao final de cada apresentação
de "O Avarento", Jorge Dória surpreende a platéia, em meio aos
aplausos, e afirma: "Muito do que
vocês riram não foi escrito por
Molière, mas tenho certeza absoluta de que ele teria se orgulhado
se estivesse aqui". O espetáculo
estréia hoje em São Paulo.
O ator comediante Dória, 81,
outorga-se a liberdade de inserir
cacos a peça do século 17. Diz agir
assim para celebrar a "irreverência genial" do ator, diretor e dramaturgo francês Jean-Baptiste
Poquelin, de pseudônimo Molière (1622-1673).
Na empreitada, Jorge Dória tem
um aliado, o dramaturgo João Bethencourt, que também assina a
tradução -e cacos de "L'Avare"
(1668). A montagem carioca estreou em 99 e já percorreu outros
Estados, como Bahia, Minas Gerais, Brasília e Paraná, sendo vista
por mais de 385.000 espectadores,
de acordo com dados da produção do espetáculo. "Isso é como
um casamento e com todos os
problemas e soluções que isso implica. O segredo do Jorge é que ele
cresce com a temporada do espetáculo, procura o caminho para
transformar e dar mais vida ao
personagem", observa Bethencourt.
Crítica social
É o 12º projeto teatral de Dória e
Bethencourt, que já passaram por
outras montagens de Molière, como "Escola de Mulheres", "Tartufo" e "As Malandragens de Scapino."
Poquelin, como Dória prefere
tratá-lo, não dispunha de liberdade para desforrar críticas à sociedade da época.
"Em suas intrigas, ele não tinha
o conhecimento do mundo como
dispomos hoje", afirma Dória.
"No entanto, do caráter do ser
avaro ele conhecia bem." Bethencourt lembra outras variantes demasiado humanas do comediógrafo, como o retrato da hipocondria em "O Doente Imaginário",
da hipocrisia em "O Misantropo"
ou da "galinhagem" em "Don
Juan".
O sovina Harpagão, que enterra
um baú com moedas no quintal
de casa, "é um homem que se veste de preto para lavar a roupa de
quatro em quatro anos, que dispensa o uso de móveis em sua residência e que tem como principal
atividade emprestar dinheiro a juros", no resumo bem-humorado
do ator.
"Com a simples presença desse
personagem em cena, mesmo
agarrado a uma alça de caixão,
Molière quebra a percepção que
as pessoas têm do ser humano",
afirma Dória.
A comédia de erros centra-se no
interesse de Harpagão em arranjar o casamento dos filhos, Elisa
(Gláucia Rodrigues) e Cleanto
(Edmundo Lippi). Em paralelo,
investe no próprio casamento
com a mulher pela qual o filho
também é apaixonado, Mariana
(Janaína de Prado). Tudo é costurado pela casamenteira Frosine
(Jacqueline Laurence), de olho no
faturamento das uniões de encomenda.
Aos 55 anos de carreira, comediante assumido (da estirpe de
Dercy Gonçalves ou Procópio
Ferreira), Jorge Dória diagnostica
certa resistência no país ao gênero, sobretudo no meio intelectual.
"Sempre digo que, se Molière fosse vivo, jamais seria indicado ao
prêmio que leva o seu nome",
afirma, citando o prêmio teatral
extinto no país nos anos 90.
O AVARENTO - de: Molière.
Tradução e direção: João Bethencourt. Com Jorge
Dória, Henrique César, Gustavo Ottoni,
Marcio Ricciardi e outros.
Onde: teatro
Hilton (av. Ipiranga, 165, centro, SP, tel.
0/xx/11/3259-6508).
Quando: estréia
hoje, às 21h; sex. e sáb., às 21h; dom., às
19h.
Quanto: R$ 25 a R$ 30. Até 31/3.
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