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CORTÁZAR
A gênese de um clássico
CYNARA MENEZES
especial para a Folha
Mais do que uma
estratégia editorial,
é uma sorte que o
segundo volume da
"Obra Crítica" de
Julio Cortázar saia
agora, pouco depois do relançamento de "O Jogo da Amarelinha" ("Rayuela"), obra máxima
do escritor argentino (1914-1984).
São textos sobre literatura escritos entre 1941 e 1963, período justamente anterior a "Rayuela"
(lançado em 63), e que funcionam
como uma espécie de rastreamento da gênese do livro, mostrando o que lia, pensava e o que
iria inspirar Cortázar na confecção de uma das obras mais originais da história da literatura.
"Rayuela" é, segundo o próprio
autor, não um, mas dois livros: o
que se lê do princípio até o capítulo 56 e o que se lê, conforme suas
instruções, em capítulos alternados, a começar do 73. É de liberdade que se está falando e, sendo
assim, "Rayuela" não são dois,
mas múltiplos livros.
Ambientado em Paris, onde viveu Cortázar, sua "história" é a da
busca da Maga, a personagem
central, pela boêmia capital francesa de então. Será encontrada?
Como no jogo infantil, pulam-se
casas, volta-se atrás. O "Céu" (o final do jogo) parece distante.
No último texto deste volume
da "Obra Crítica", dirigido a leitores cubanos, Julio Cortázar dá alguma pista sobre a origem de sua
singular inventiva.
Adverte que pertence ao "gênero chamado de fantástico por falta
de melhor nome", mas tampouco
define em qual se encaixaria. Aí se
pode ver onde ele bebe: muitos
dos escritos defendem o surrealismo e abraçam o existencialismo.
Trata de Rimbaud sob o signo
do surrealismo, a quem defende
em "Um Cadáver com Vida", e se
extasia diante de "Os Esquecidos", de Luis Buñuel. Elogia "A
Náusea", de Jean-Paul Sartre, e
critica o estabelecimento de um
vínculo entre os existencialistas e
o irracionalismo -e, por conseguinte, o nazismo.
O fantástico, ainda que rejeite o
termo, fascina o escritor, que delicia quando se dedica, em 51 (ano
de lançamento de sua primeira
obra dramática, "Los Reyes"), à
vida do norte-americano Edgar
Allan Poe, de quem analisa os
principais contos, como "A Queda da Casa de Usher" ou "Ligeia".
Lia também histórias policiais e
seus contemporâneos, como Victoria Ocampo, sua editora na revista "Sur", a quem fala em segunda pessoa em uma das resenhas.
E, curiosamente, se dedicava ainda a teorizar sobre o romance
-modéstia de quem se acreditava contista, não romancista?
A esse respeito, vale reproduzir
o que diz, concordando com um
amigo que comparava os dois gêneros ao boxe: "O romance sempre ganha por pontos, ao passo
que o conto precisa ganhar por
nocaute". Com "Rayuela", Cortázar subverteu a máxima, e nocauteia aos poucos, deixando o leitor
tonto a cada capítulo, esperando a
contagem para recomeçar.
Uma observação apenas: em
ambos os volumes, faz falta uma
foto do rosto marcante e estranho
de Julio Cortázar, com seus olhos
separados "como os de um novilho", como descreveu certa vez
Gabriel García Márquez.
Avaliação: 0("O Jogo da
Amarelinha" e "Obra Crítica - vol. 2")
Livro: O Jogo da Amarelinha
Título Original: Rayuela
Autor: Julio Cortázar
Tradutor: Fernando de Castro Ferro
Editora: Civilização Brasileira
Quanto: R$43 (640 págs.)
Livro: Obra Crítica - vol. 2
Autor: Julio Cortázar
Tradutores: Paulina Wacht e Ari
Roitman
Editora: Civilização Brasileira
Quanto: R$ 38 (368 págs.)
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