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Gil apóia projeto de criminalização do jabá; rádios se opõem
Música vigiada
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Está em gestação um projeto de
lei que irá agitar a indústria fonográfica e as rádios: a criminalização do jabá (execução de música
mediante pagamento).
A proposta está sendo elaborada pelo deputado federal Fernando Ferro (PT-PE) e deverá ser
apresentada ao Congresso ainda
no primeiro semestre deste ano.
O objetivo do parlamentar é
proibir que as emissoras cobrem
para inserir uma música em sua
programação, o que, segundo ele,
tira o espaço de artistas iniciantes.
A iniciativa já ganhou o apoio
do ministro Gilberto Gil (Cultura)
e a oposição das rádios, que lucram com esse esquema de divulgação.
Segundo a Folha apurou, grandes redes de rádio chegam a cobrar até R$ 20 mil para inserir
uma música de lançamento em
sua programação. As gravadoras
negam a existência de jabá, e a Associação Brasileira dos Produtores de Discos, que as congrega,
afirma que não se pronuncia sobre o assunto porque o projeto de
lei ainda não existe.
Entre artistas consultados pela
reportagem, a maioria adota postura cautelosa, mas com posicionamento a princípio favorável à
criação da lei. "O bacana do momento é que se sente finalmente
um movimento de representação
efetiva das demandas da classe
musical. Não é à toa que estão retirando os esqueletos de dentro
dos armários", diz Lulu Santos.
No ano passado, o cantor havia
criticado a lei que pedia a numeração dos CDs, visando um maior
controle da indústria fonográfica
(a regra foi aprovada e entra em
vigor no próximo dia 22).
Lenine, um dos que encamparam a luta pela numeração, hoje
fica do mesmo lado de Lulu:
"Sou completamente contra o
jabá. As concessões de rádios têm
regras, e uma delas é que o veículo
pode comercializar seus intervalos. Negociar o tempo destinado à
veiculação de trabalho artístico
são outros quinhentos".
O compositor embute em sua
crítica a questão de as rádios veicularem música sem avisar seus
ouvintes de que se trata de matéria paga, às vezes até disfarçando-a de parada de sucessos.
Os termos da lei do jabaculê estão sendo discutidos com Lobão,
já conhecido pela oposição a essa
prática, comum em AMs e FMs. O
músico diz que quer incluir na redação do projeto "a criminalização do jabá, designando punições
severas como multa, perda de
concessão da emissora e prisão".
Na semana passada, Lobão
apresentou a proposta do projeto
de lei a Gilberto Gil e obteve seu
aval. O assunto foi debatido numa
reunião de exposição dos primeiros cem dias de governo para a
classe artística, na segunda-feira
da semana passada, no Rio.
"Muito bem, Lobão, você está
um garotão", brincou Gil, quando
o cantor apresentou, dentre vários planos para a cultura, a intenção de coibir o jabá.
O ministro, segundo sua assessoria de imprensa, demonstrou
apoio ao projeto, principalmente
porque quer estimular os artistas
a se mobilizar e a propor soluções
para o que consideram problemas do meio.
A aprovação de Gil também selou a reconciliação entre ele e Lobão, que havia criticado sua escolha para o Ministério da Cultura.
Merchandising
O deputado Fernando Ferro
afirmou à Folha que o problema
do jabá é que ele força o consumo
na indústria fonográfica. "Os ouvintes consomem uma operação
financeira, e não uma opção de
programação."
Além do pagamento informal
de jabá, Ferro rejeita também os
métodos mais modernos do esquema, a chamada "verba de divulgação", paga pelas gravadoras
às rádios com nota fiscal.
"Esse é um nome cínico dado à
mesma operação, que força mercados e exclui artistas que não tenham estrutura para tanta concorrência", afirmou.
Segundo ele, as rádios teriam
pelo menos a obrigação de deixar
claro que determinada música está sendo tocada mediante pagamento. "Seria uma maneira de dividir o espaço editorial do publicitário, deixando claro que a seleção da música foi resultado de negociação financeira."
Antonio Rosa Neto, presidente
do GPR (Grupo dos Profissionais
do Rádio) não concorda com a separação e compara o jabá de rádio
ao merchandising nas novelas.
"Se o consumidor souber que
alguém pagou para aquele produto entrar na história, a propaganda perde a força. Da mesma forma seria se o ouvinte soubesse
que uma música está no ar porque houve pagamento."
Para o parlamentar, essa distinção seria obrigatória, principalmente pelo fato de TVs e rádios serem concessões públicas.
Rosa Neto também refuta esse
argumento. "Emissoras são empresas e têm de faturar."
Ferro afirma que vai se basear
na legislação de outros países em
relação ao jabá. Ele já pediu o texto da lei norte-americana à embaixada dos Estados Unidos, onde a prática é chamada "payola".
Lá, ficou célebre a investigação
promovida nos anos 60 pelo Congresso Nacional contra empresários musicais como Dick Clark e
DJs como Alan Freed, que haviam
desempenhado papel fundamental na ascensão do rock'n'roll e do
rhythm'n'blues nas paradas.
Os congressistas estavam convencidos de que as rádios só tocavam rock porque eram subornadas com dinheiro -ou seja, jabá.
Investigado, Alan Freed declarou-se culpado no tribunal, teve sua
carreira arruinada e abriu precedente para um controle rigoroso
da questão no país.
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