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ARTES PLÁSTICAS
Objetivo, escritor alemão vincula Rodin à sua época
TIAGO MESQUITA
CRÍTICO DA FOLHA
Por vias tortas, Rainer Maria
Rilke (1877-1926), nesta coleção de textos sobre Auguste Rodin (1840-1917), relançada pela Nova Alexandria, consegue aproximar um artista de seu tempo.
Com um tom provisório, à cata de
definições para o que havia de novo na obra do francês, o escritor
de língua alemã, ao se ater a um
aspecto autônomo da obra de Rodin, encontra o nexo dela com o
mundo.
Tem ambiguidade por todo lado na plástica do mestre francês.
Com a paternidade de uma tradição que vem da escultura de Michelangelo, sua obra se abastardou e mostrou desejo arraigado
de ruptura. Sem risco poderíamos
encontrar em estátuas de Rodin
tanto os episódios do brilho material como a renovação do bronze,
num realismo moderno, comprometido com a superfície das peças, menos temático e mais visual.
Por meio de sua acurada modelagem, há tanto uma dramatização das cenas narradas como a potencialização de uma superfície
das peças. Por seu aspecto transitório, os critérios e ênfases a serem dados aos trabalhos passam a
ser tateados, encontrados em um
campo de valores distintos.
O caminho para Rilke também
não era seguro. O escritor aprofundava inquietações poéticas à
procura de uma linguagem mais
objetiva, concreta e descritiva. O
convívio com o francês certamente teve muito peso nesta transição.
E é a objetividade que mobiliza
grande parte do interesse de Rilke
na obra de Rodin. Uma obra em
que os fenômenos escultóricos
acontecem em cada trabalho. Como se fremissem o bronze, criassem rugas nele e o mostrassem
como ação autônoma. Deste modo, o escritor desvincula os méritos de Rodin de um tom alusivo
da leitura acadêmica.
O que prevalece na análise de
Rilke é menos o tom narrativo e
mais o tratamento dado à superfície, que coloca a peça para agir no
presente. Independente de sua
função de ilustrar uma narrativa,
a modelagem mostra força no seu
ritmo, como se desse uma presença vital ao material esculpido.
A vida atribuída às peças não
vem do papel que cada estátua
tem na narrativa histórica que as
agrupa. Ela aparece no enrugado
orgânico e suave que o artista dá
ao metal. Em sua singularidade e
autonomia.
Por isso a idéia da obra "não
acabada", que desafiava uma sensibilidade acadêmica, é importante. Refere-se ao momentâneo, a
uma série de eventos que se encerram na escultura, mas não a diluem em um ato com começo,
meio e fim. Refere-se a uma série
de eventos simultâneos que despertam o objeto de seu sono, dando chance para a beleza. Pois a beleza encontra amparo no singular
e vital. Como diz Rilke, ela pousa
nas peças "como um acréscimo".
É desta capacidade de despertar
os objetos que Rilke vincula Rodin à sua época. Talvez este seja o
aspecto mais forte do texto. Como
na análise que o artista faz do
francês Paul Cézanne (1839-1906),
ele procura em Rodin uma espécie de vigor do trabalho para despertar a história. Este labor vai
contra uma certa assepsia da modernização. Desperta a matéria,
pelo contato diário e disciplinado
com o seu meio, e a torna singular, cheia de sumo. O trabalho
transforma a natureza sem desmontá-la em partes sem sentido.
Pelo contrário, lhe dá vigor, como
os movimentos de trabalhadores
do começo do século davam viço
a seu período histórico.
Auguste Rodin
Autor: Rainer Maria Rilke
Editora: Nova Alexandria
Quanto: R$ 26 (176 págs.)
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