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São Paulo, terça-feira, 15 de abril de 2003

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LITERATURA

Em "Namorada Nš 44", inglês Mark Barrowcliffe faz um retrato "engraçado e honesto da alma masculina"

"Os homens são rasos, bobos e inúteis"

Ian Nicholson/Associated Press
A região central de Londres, onde é ambientado o livro "A Namorada Nš 44...", de Mark Barrowcliffe


THIAGO NEY
DA REDAÇÃO

Pensa que os personagens masculinos dos livros de Nick Hornby são vazios, egoístas e chauvinistas? Pois então espere até encontrar os homens que habitam o universo de Mark Barrowcliffe.
Este inglês de 39 anos está desembarcando no Brasil com seus dois primeiros romances: "A Namorada Nš 44 de Harry Chess" (que já está nas prateleiras) e "A Infidelidade de Stewart Dagman, Pai de Primeira Viagem" (previsto para a Bienal Internacional do Livro do Rio, de 15 a 25 de maio).
Ao mesmo tempo em que recebeu elogios por ser um retrato "engraçado e honesto da alma masculina", "A Namorada..." foi malhado bastante por ser um retrato "engraçado e honesto da alma masculina" -o último ponto de vista emitido principalmente por jornalistas femininas.
"Não consigo imaginar por que essas mulheres ficaram tão irritadas. Eu escrevi [o livro] em parte como uma paródia aos homens e suas atitudes; para fazê-los parecer ridículos. É, essencialmente, um conto moral. Os dois personagens são tão claramente fracassados... Os homens são rasos, bobos e inúteis, e acho que apresento bem isso", disse Barrowcliffe à Folha, por e-mail, de Londres.
Os dois "fracassados" são Harry Chess -um produtor de TV de 32 anos que passou a vida tentando transar com a maior quantidade possível de garotas em busca da parceira perfeita- e seu amigo e "roomate" Gerrard -um paramédico com apenas dois ou três relacionamentos sérios no currículo, pois as mulheres que encontra são sempre ou gordas demais ou magras demais ou altas demais ou baixas demais ou...
A coisa muda quando o amigo Farley comete suicídio. Antes mesmo do enterro dele, Harry (cuja namorada está no Pólo Sul) e Gerrard (que foi "chutado" há um ano) saem à caça da mulher que provocou a morte de Farley. Ao encontrarem Alice, encontram a mulher ideal. O problema é que ela é ideal para os dois.

"Os caras bons"
Pelas 400 e poucas páginas do livro, a dupla destila seus dogmas femininos: medir entre 1,67 m e 1,69 m; manequim 40; inteligente, mas não muito; não falar demais, ter menos de 27 anos... Nas palavras de Harry: "Tudo o que eu quero numa mulher é a perfeição de corpo e mente. O resto -carreira, emprego, filhos, dinheiro, sucesso- ela pode procurar enquanto eu estou no pub".
"A má notícia é que esses são os "caras bons". Eles não batem em mulheres, não esperam ter empregos melhores do que as mulheres... Na verdade, eles estão felizes que as mulheres tomem todas as decisões de suas vidas", explica Barrowcliffe.
"O que digo às mulheres que ficam irritadas com o jeito que elas são tratadas no livro é: "Desculpe, mas é assim que os homens são". Também diria para prestarem atenção à história, não apenas aos personagens. De certa forma, Harry e Gerrard são vilões, não os coloco como modelos a serem seguidos. Eles não são capazes de serem felizes enquanto permanecem com essa atitude."
Barrowcliffe não faz uso -pelo menos não tanto- de referências à cultura pop como o conterrâneo Hornby, mas a escrita ágil e o modo como os dois destrincham a psique masculina serviram como motivos de comparação.
"Sinto-me lisonjeado com a comparação como eu ficaria com qualquer outro bom escritor. Nossos personagens vêm de classes sociais similares e têm interesse em coisas parecidas. Mas acho que os personagens dele são ainda mais realistas e mais "legais". Enquanto os dele ouvem CDs, os meus usam as disqueteiras como cinzeiros", brinca. "Um jornal norte-americano comparou meu estilo com o de Terry Southern. Gosto mais desse jeito barroco, "selvagem" de escrever."
Barrowcliffe cita alguns de seus escritores prediletos: "PG Wodehouse, Oscar Wilde, Jane Austen, Muriel Spark, Brett Easton Ellis, Stan Lee... E, sei que não é "cool", mas, também, Martin Amis".

Comediante
Antes de se tornar escritor "profissional", Barrowcliffe foi subeditor do jornal "Financial Times", escrevia uma coluna na revista "The Big Issue" e fazia apresentações em bares britânicos como comediante.
"Minha experiência como comediante me ensinou que as pessoas não podem te atirar coisas se você ficar sentado em frente ao computador e não sair de casa. Bem, elas podem, mas terão que fazer um esforço muito maior... Eu gostava de minha vida como comediante, mas dava muito trabalho. Tinha que estar em certo lugar na hora certa, viajar. Não, obrigado. Agora eu escrevo deitado em minha cama!", brinca.
Em "A Infidelidade de Stewart Dagman....", Barrowcliffe continua sua saga para desconstruir a alma masculina. "[O livro] É sobre um homem que não merece se tornar pai, mas que se torna um pai. Sobre as consequências de ser um homem idiota."


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