São Paulo, sexta-feira, 15 de maio de 2009

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Crítica

"Simonal" refaz saga de cantor

Documentário empolgante busca entender o porquê da ascensão e queda meteóricas de Wilson Simonal

MARCUS PRETO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Onde você estava quando Wilson Simonal morreu [25 de junho de 2000]? É quase impossível encontrar alguém que localize na memória um rastro daquele dia -ao contrário de quando falamos nas mortes de Elis Regina, Renato Russo, Cássia Eller ou outros ídolos. A razão é simples: Simonal estava morto havia quase duas décadas e meia quando foi enterrado.
É nesse vácuo histórico que mora parte da força de "Simonal - Ninguém Sabe o Duro que Dei", documentário do trio Claudio Manoel, Micael Langer e Calvito Leal. O filme apresenta ao espectador com menos de, vá lá, 50 anos um artista que ele desconhece. Mais que isso: dois artistas em um só.
De um lado, imagens de arquivo e depoimentos de amigos constroem o Simonal pop da década de 60. Talentoso e carismático, tinha seu próprio programa na TV e domínio absoluto sobre quem parasse para ouvi-lo cantar. Sua voz exuberante dava conta de lotar 300 shows por ano. Fazia tanto sucesso que quase emparelhou com Roberto Carlos como o artista mais popular do Brasil.
Do outro, nos é montado o Simonal pós-1975. Apagado da história. Magoado, deprimido, alcoólatra, quase sem voz. Que, já nos anos 80, assistia aos shows dos filhos Wilson Simoninha e Max de Castro escondido atrás de pilastras para que sua presença ali não maculasse também o destino dos meninos. Um morto-vivo alimentando a cirrose que, enfim, acabaria de vez com sua vida.
É buscando as obscuras ligações entre essas duas metades de um mesmo personagem que o filme se constrói. Não por acaso, muitos de seus cerca de 85 minutos enfocam esse ponto de virada, quando o primeiro Simonal comete o erro fatal que o transforma no segundo.
Aconteceu no final de 1971. Por suspeitar que estivesse sendo roubado, o cantor teria mandado bater no contador de sua empresa. Só que o homem vai parar no Dops (Departamento de Ordem Política e Social, hoje extinto), onde é torturado. Não demora até que os jornais liguem as pontas -não necessariamente cobertos de verdade- e publiquem a manchete: "O cantor Wilson Simonal é informante dos órgãos de segurança do Estado".

Princípio jornalístico
Parte considerável da repercussão que o filme alcançou nos festivais em que já foi apresentado se deve ao fato de seus criadores terem seguido um princípio básico do jornalismo.
Pela primeira vez foram checar "o outro lado" e deram voz ao ex-contador. Seu depoimento não contribui para confirmar a imagem de dedo-duro que resultaria no sepultamento em vida de Simonal. Mas traz à tona falhas de caráter que enriquecem ainda mais o personagem. E o filme.
Mais que biografar a ascensão e queda meteóricas de um ídolo -e isso é feito de maneira empolgante-, o documentário reescreve a saga de Simonal para que, conhecendo finalmente sua história, o Brasil possa absolvê-lo de coisas que talvez ele nem sequer tenha feito.


SIMONAL - NINGUÉM SABE O DURO QUE DEI
Direção:
Cláudio Manoel, Micael Langer e Calvito Leal
Produção: Brasil, 2008
Quando: em cartaz no HSBC Belas Artes, Anália Franco e circuito
Classificação: 14 anos
Avaliação: bom



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