São Paulo, sexta, 15 de maio de 1998

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CRÍTICA
CD é diário de viagem do rock

especial para a Folha

Com "Citizen Wayne", seu terceiro álbum lançado pelo selo Epitaph Records, o guitarrista e vocalista de Detroit, Wayne Kramer, coroa uma fase de glorioso e suado ressurgimento das cinzas.
A idéia é revisitar o passado, expiar os pecados com raça e bom humor, contar a versão da (sua) história e se atirar de cabeça no futuro.
O rock salvou Wayne Kramer, o herói de guerra caído. E ele voltou para agradecer. E pagar a dívida.
Fechando uma espécie de trilogia da volta por cima, que terá como apêndice um disco ao vivo, "Citizen Wayne" é um diário de viagem que revela um cronista impagável e um guitarrista poderoso e versátil.
Trabalhando com uma formação extremamente enxuta, que conta com a participação do co-produtor David Was, Kramer emoldura episódios selecionados de sua vida nos grooves mais escorregadios, disparando sua Fender branca para todos os lados.

"Stranger in the House" e "Back When Dogs Could Talk" abrem o disco em clima tenso, com saraivadas de guitarra protometálica e a voz atormentada, que discute (com) os dias de consumo de LSD, John Coltrane, o partido "White Panthers" e os fuzis.
"Revolution in Apt. 29" o próprio Kramer explica: "Você sabe, não devemos nos levar tão a sério, a idéia é manter o senso de humor. Quando você está destruindo o sistema, você tem que manter o sorriso nos lábios e a canção no coração (risos)".
Falácia
Em "Down on the Ground" somos atirados violentamente na batalha do MC5 contra o "sistema" americano, testemunhamos Allen Ginsberg armando um mantra, o crânio explodindo com o cacetete, os helicópteros ameaçando com rasantes e Kramer "tocando minha guitarra, com a batida entrando sobre a maravilhosa sirene cósmica... estou disparando o "feedback' pra galera".
"No Easy Way Out" é o canto de redenção de Kramer, sua balada da salvação do pecado apelo amor.
"You Don't Know My Name" é funk da pesada; "Count Time" é pura tiração de onda com seus horrores carcerários. "Mas vossa excelência, foi o seu camarada que apareceu com a mala cheia de notas de cem dólares, eu estava sem emprego..."
"Snatched Defeat" é emoção em estado bruto. "Viver intensamente e morrer jovem, uma melodia menor...", desdenha Kramer, ao estampar o amigo Johnny Thunders como paradigma involuntário da falaciosa mitificação da decadência no rock'n'roll.
Wayne Kramer fez, com "Citizen Wayne", um dos melhores discos de rock da década. Só isso.
(FM)

Disco: Citizen Wayne Artista: Wayne Kramer Lançamento: Epitaph Records Quanto: R$ 18 (em média)
Onde encontrar/encomendar: lojas London Calling (tel. 011/223-5300); Sweet Jane (tel. 011/288-4847); Bizarre (tel. 011/220-7933)



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