São Paulo, quinta-feira, 15 de junho de 2000


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"Me, Myself & Irene", da dupla de "Quem Vai Ficar com Mary?", entra na mira de ONG que protege doentes mentais
Jim Carrey - Filme do ator escandaliza ao fazer piada com a esquizofrenia

Divulgação
Jim Carrey, astro do filme "Me Myself & Irene", que estréia dia 23 nos Estados Unidos


SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK

"From gentle to mental." Esta frase, que em inglês quer dizer "de gentil a débil mental", é o slogan do filme "Me, Myself & Irene", o novo título dos irmãos Farrelly, com o comediante Jim Carrey no papel principal, que estréia dia 23 nos EUA.
Foi o que bastou para que a comédia dos irmãos criadores dos sucessos politicamente incorretos "Quem Vai Ficar com Mary?" (US$ 350 milhões arrecadados no mundo inteiro) e "Debi & Lóide" (US$ 150 milhões) entrasse na mira da barulhenta Nami.
Nami é a sigla em inglês para Aliança Nacional para Defesa dos Doentes Mentais, uma ONG cujo braço principal é a Rede dos Caçadores de Estigma, que luta contra Hollywood e as emissoras de TV norte-americanas para acabar com a visão estereotipada que alguns filmes/programas passariam dos doentes mentais.
A reclamação principal da Nami é que o filme "Me, Myself & Irene" perpetuaria o mito de que esquizofrenia é o mesmo que ter múltipla personalidade (não é).
No filme, Jim Carrey é Charlie, um policial rodoviário de Rhode Island que, perdedor em todos os setores, traído pela mulher e desrespeitado pelos amigos, desenvolve uma segunda personalidade -Hank, sujeito abusado e sem frescuras, cafajeste e conquistador barato. E ambos se apaixonam pela mesma mulher, Irene (Renée Zellweger).
É da relação entre Charlie e Hank e do tipo de comédia física que a situação dá a Jim Carrey que vêm 90% da graça do filme.
Acrescente a isso um melhor amigo albino, um rival anão, negro e doutor em Harvard, uma vaca que é morta a tiros no meio de uma rodovia e três filhos bastardos que parecem cantores de rap e falam dez palavrões a cada frase, e eis um legítimo produto com a marca Farrelly.
Numa carta a Bill Mechanic, presidente do estúdio 20th Century Fox, detentor dos direitos do filme, a diretora-executiva da associação, Laurie Flinn, pede, entre outras coisas, que:
* em anúncios em rede nacional, pagos pela Fox, Jim Carrey fale da verdadeira natureza da esquizofrenia, seus sintomas e oportunidades de tratamento e recuperação;
* durante entrevistas a "talk shows" e jornais sobre o filme, o ator esclareça as principais diferenças entre múltipla personalidade e esquizofrenia.
O estúdio não quis comentar o caso, mas, em entrevista na semana passada, os irmãos Farrelly falaram à Folha sobre o tipo de protesto que o filme poderia causar.
"Nós não temos limites para nosso humor", disse Bobby Farrelly, que dirige o filme. "Mas procuramos usar os deficientes, as minorias e os retardados sempre de modo simpático, integrado ao ambiente, que é como acontece na nossa realidade", completa Peter Farrelly, o roteirista.
Diga-se a favor da dupla -uma espécie de versão demente e mais engraçada dos irmãos Coen- que "Me, Myself & Irene" é a coisa mais hilariante do ano 2000 a chegar às telas grandes até agora.
Eles não medem as palavras e preferem chamar doentes mentais de "retardados" ao politicamente correto "doente mental", por exemplo -"É como todo o mundo fala", disseram, "e tivemos apenas uma carta reclamando de nossos filmes até hoje."
A ONG promete não parar por aí, e seu currículo de barulho a credencia. Em abril deste ano, em parte devido a pressões da Nami, em parte devido à audiência não ter alcançado o número previsto, a emissora ABC tirou o programa "Wonderland" do ar.
A série era ambientada num manicômio judicial; a associação achou que vincular doença mental sempre à violência, como "Wonderland" fazia, seria prejudicial à imagem dos doentes.


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