São Paulo, sexta-feira, 15 de junho de 2007

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Enrique Diaz dirige Cia. dos Atores em peça sobre uma peça no Sesc

Grupo carioca apresenta "Gaivota", texto de autoria do russo Anton Tchecov

GUSTAVO FIORATTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Normalmente são leituras de peças, e não montagens, que se desenrolam com atores sentados em cadeiras enfileiradas, de frente para a platéia. Está aí, portanto, um início interessante para "Gaivota - Tema para um Conto Curto", peça de Tchecov adaptada e dirigida por Enrique Diaz, que estréia hoje no Sesc Pinheiros.
Já que o original russo, escrito em 1895, se desenvolve em torno de um grupo de atores, que tal utilizar mais metalinguagem num trabalho que já fala de si mesmo? Quando o espetáculo começa, estamos à frente de Enrique Diaz, Emílio de Mello, Mariana Lima, Gilberto Gawronski, Felipe Rocha, Bel Garcia e Bel Teixeira. Os personagens da peça vão circular pelas mãos de cada um desses intérpretes.
Atores, durante uma peça, são atores em cena, não são apenas personagens. É nesse campo que Diaz, desde "Ensaio.Hamlet" (adaptação para "Hamlet", com a carioca Cia. dos Atores), trabalha atualmente. Tanto que a primeira fala dessa adaptação de "A Gaivota", na boca de um ator qualquer, é: "Eu me pergunto: "Como começar uma peça que fala do fracasso de uma peça?'". Outro ator diz: "A primeira vez que esta peça foi encenada, em 1896, foi um fracasso, depois o Teatro de Arte de Moscou montou e foi um sucesso".
A platéia fica, desde o início, avisada de que vai assistir a um jogo sobre como encenar uma peça que fala sobre uma peça.
Diaz aproveita para conduzir o espectador por um mergulho cênico, envolvendo-o em um trabalho ritualístico que pressupõe a presença da platéia (como um palestrante pressupõe a de seus ouvintes). Os intérpretes, com freqüência, dirigem-se àqueles que estão ali sentados, supostamente ainda à espera de que a peça -ou uma história simplesmente- comece.
A tradicional impostação da voz do ator, aquele fingimento típico, que muitas vezes faz com que o próprio teatro soe tão antiquado, se desfaz por completo. Assim, "Gaivota" funciona como um braço da própria pesquisa naturalista de Tchecov, que já buscava evocar a passagem do tempo e seus efeitos com histórias aparentemente desprovidas de fatos, mas que guardavam ações na própria ausência de ações.

Improviso e edição
Os diálogos são, muitas vezes, bastante coloquiais, ainda que Enrique Diaz não simpatize muito com a palavra. Sua linguagem provém de uma desconstrução minuciosa do texto, que desdobra cada cena em possibilidades inúmeras. "A dramaturgia é feita na presença dos atores, com exercícios de improvisação. Muitas vezes eu peço para que os atores, sozinhos ou em grupos, criem histórias a partir de cada cena. O material vai crescendo e depois é editado", diz o diretor.
"Por que você tá sempre de preto, Masha?", pergunta a figura de um diretor para a personagem central do texto de Tchecov. "Porque abriu uma caixa de grampo dentro da minha bolsa e eu não acho nada, nada, nada, nada (...), porque eu não sei rezar, porque eu perdi meu irmão...". Nada melhor do que uma caixa de grampos para situar, nos dias de hoje, uma personagem meio perdida, meio desolada com sua própria falta de perspectivas.


GAIVOTA - TEMA PARA UM CONTO CURTO
Quando:
estréia hoje; sex. e sáb., às 21h; dom., às 18h
Onde: teatro do Sesc Pinheiros (r. Paes Leme, 195, SP, tel. 0/xx/11/3095-9400)
Quanto: R$ 10 a R$ 20


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