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Enrique Diaz dirige Cia. dos Atores em peça sobre uma peça no Sesc
Grupo carioca apresenta "Gaivota", texto de autoria do russo Anton Tchecov
GUSTAVO FIORATTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Normalmente são leituras de
peças, e não montagens, que se
desenrolam com atores sentados em cadeiras enfileiradas, de
frente para a platéia. Está aí,
portanto, um início interessante para "Gaivota - Tema para
um Conto Curto", peça de
Tchecov adaptada e dirigida
por Enrique Diaz, que estréia
hoje no Sesc Pinheiros.
Já que o original russo, escrito em 1895, se desenvolve em
torno de um grupo de atores,
que tal utilizar mais metalinguagem num trabalho que já fala de si mesmo? Quando o espetáculo começa, estamos à frente de Enrique Diaz, Emílio de
Mello, Mariana Lima, Gilberto
Gawronski, Felipe Rocha, Bel
Garcia e Bel Teixeira. Os personagens da peça vão circular pelas mãos de cada um desses intérpretes.
Atores, durante uma peça,
são atores em cena, não são
apenas personagens. É nesse
campo que Diaz, desde "Ensaio.Hamlet" (adaptação para
"Hamlet", com a carioca Cia.
dos Atores), trabalha atualmente. Tanto que a primeira fala dessa adaptação de "A Gaivota", na boca de um ator qualquer, é: "Eu me pergunto: "Como começar uma peça que fala
do fracasso de uma peça?'". Outro ator diz: "A primeira vez
que esta peça foi encenada, em
1896, foi um fracasso, depois o
Teatro de Arte de Moscou
montou e foi um sucesso".
A platéia fica, desde o início,
avisada de que vai assistir a um
jogo sobre como encenar uma
peça que fala sobre uma peça.
Diaz aproveita para conduzir o
espectador por um mergulho
cênico, envolvendo-o em um
trabalho ritualístico que pressupõe a presença da platéia (como um palestrante pressupõe a
de seus ouvintes). Os intérpretes, com freqüência, dirigem-se
àqueles que estão ali sentados,
supostamente ainda à espera
de que a peça -ou uma história
simplesmente- comece.
A tradicional impostação da
voz do ator, aquele fingimento
típico, que muitas vezes faz
com que o próprio teatro soe
tão antiquado, se desfaz por
completo. Assim, "Gaivota"
funciona como um braço da
própria pesquisa naturalista de
Tchecov, que já buscava evocar
a passagem do tempo e seus
efeitos com histórias aparentemente desprovidas de fatos,
mas que guardavam ações na
própria ausência de ações.
Improviso e edição
Os diálogos são, muitas vezes, bastante coloquiais, ainda
que Enrique Diaz não simpatize muito com a palavra. Sua linguagem provém de uma desconstrução minuciosa do texto,
que desdobra cada cena em
possibilidades inúmeras. "A
dramaturgia é feita na presença
dos atores, com exercícios de
improvisação. Muitas vezes eu
peço para que os atores, sozinhos ou em grupos, criem histórias a partir de cada cena. O
material vai crescendo e depois
é editado", diz o diretor.
"Por que você tá sempre de
preto, Masha?", pergunta a figura de um diretor para a personagem central do texto de
Tchecov. "Porque abriu uma
caixa de grampo dentro da minha bolsa e eu não acho nada,
nada, nada, nada (...), porque eu
não sei rezar, porque eu perdi
meu irmão...". Nada melhor do
que uma caixa de grampos para
situar, nos dias de hoje, uma
personagem meio perdida,
meio desolada com sua própria
falta de perspectivas.
GAIVOTA - TEMA PARA UM CONTO CURTO
Quando: estréia hoje; sex. e sáb., às
21h; dom., às 18h
Onde: teatro do Sesc Pinheiros (r. Paes Leme, 195, SP, tel. 0/xx/11/3095-9400)
Quanto: R$ 10 a R$ 20
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