|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CURTA-METRAGEM
Filmes desvelam racismo cordial no país
CRISTIAN AVELLO CANCINO
free-lance para a Folha
Há uma comunidade que agoniza no interior de Goiás, muito
embora seus habitantes digam
gostar de viver por lá uma existência impregnada de nostalgia e
incerteza. São os personagens do
curta-metragem "Negros de Cedro", de Manfredo Caldas, que
abre hoje, às 18h, mais uma quinzena do ciclo Curta às Seis, no Espaço Unibanco.
Na verdade, trata-se de personagens de uma história longa,
exemplares tardios da colonização portuguesa, que confinou os
negros brasileiros à margem insuportável do esquecimento, representada no documentário de Caldas pela região erma chamada
Cedro, que, após a lei Áurea, outorgou a alguns ex-escravos a fertilização de suas terras descampadas.
Hoje, ainda estão por lá os descendentes desses escravos, mas,
como se não houvesse fim para a
intolerância da colonização, chegam agora brancos endinheirados, pilotando tratores, ceifando
o que vêem pela frente.
O registro desse processo extemporâneo de dominação levou
quatro prêmios no 31º Festival de
Brasília, realizado no ano passado.
Se "Negros de Cedro" trata do
esquecimento e da intolerância,
"O Melhor Amigo do Homem",
de Tânia Savieto, com fotografia
de Aloysio Raulino, é um curta
sem diálogos sobre a dissimulação do preconceito. Por isso mesmo é sem palavras, mostra apenas
imagens de um treinamento de
cães pastores alemães. O alvo de
seus ataques é um negro robusto,
zombeteiro, que atiça a ferocidade dos cães com uma dança debochada e ritualística, um negro que
carnifica a violência urbana.
É provável que os donos dos
cães que participaram daquela filmagem nem soubessem que estavam domesticando seus animais
para o exercício do preconceito,
mas o filme diz muito sobre uma
sociedade que não discute o racismo, que prefere encobri-lo com o
silêncio, desempenhando aquilo
a que se deu o nome de "racismo
cordial".
O mesmo ponto é apenas roçado por "Viver a Vida", de Tata
Amaral. Este mostra um office
boy que, apesar de ser tratado como burro de carga, se diverte enganando sua chefe, que, por sua
vez, é pressionada por um patrão
"mauricinho" e intolerante. São
personagens caricaturais, divertidos, não deixam de transparecer
suas ambiguidades e preconceitos, mas o filme embarca num roteiro condescendente, subliminar.
Mais direto é "Padre Mestre",
que completa o programa deste
Curta às Seis. Fala de José Maurício Nunes Garcia, padre negro
que criou uma obra musical consistente no Rio colonial.
Ciclo: Curta às Seis
Quando: de 15 a 29 de outubro, sempre
às 18h
Onde: Espaço Unibanco (r. Augusta,
1.475, tel.: 0/xx/11/288-6780)
Quanto: entrada franca
Texto Anterior: Devastação social é tema de Ken Loach Próximo Texto: Rádio: "Na Balada" leva raves e clubes ao dial Índice
|