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São Paulo, quarta-feira, 15 de outubro de 2003

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ANÁLISE

"Celebridade" trafega entre crítica e cinismo

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA

Quem esperava uma pausa nos dramas da "vida real" na novela das oito se enganou.
"Celebridade", a nova novela de Gilberto Braga, que a Rede Globo estreou anteontem, confirma a veia provocativa do autor, hábil na arte de intervir em temas candentes.
No que tange a violência urbana, a nova novela começou dando continuidade a sua antecessora.
Maria Clara (Malu Mader), a heroína de "Celebridade", modelo e empresária musical, reforçou, no capítulo de estréia, a campanha dos protagonistas de "Mulheres Apaixonadas" pelo desarmamento.
Em uma, como na outra, pacifismo combina com repetidas cenas de sacanagem, com pouca ou nenhuma sutileza.
Para compensar o desgaste de "O Dono do Mundo", a personagem de Malu Mader desta vez está acima de qualquer suspeita. Mulher independente e bem sucedida, ela defende pedagogicamente a sua liberdade.
O personagem de Alexandre Borges, jornalista consagrado, bêbado e desempregado, promete uma mensagem que combina com a campanha antidrogas de "O Clone".
O casal negro, ele fotógrafo, ela modelo de sucesso, segue a linha de ação afirmativa, também compartilhada.

Estilos
É claro que há diferenças e marcas autorais. Mestre nos meandros do glamour carioca, Braga promete colocar o dedo em feridas que mobilizam a indústria da fama, jornalismo, Hollywood e a própria Globo incluídos.
A novela trata dos paradoxos de um mundo que acena com a possibilidade generalizada de ascensão via show business. O tema promete uma profusão de perspectivas.
Celebridade aparece como sinônimo de poder. Não está dada pelo sangue azul, "de berço". Merece ser disputada. Justifica ambição, confundida por vezes com vulgaridade e caradura.
Celebridades nem sempre são tão poderosas quanto parecem. Há poderes concentrados em estruturas que pouco aparecem. A celebridade é instável. Vaciladas podem dar em "desvios".

Inveja
Em uma sociedade que insiste em negar outros tipos de inclusão, como em um jogo, a celebridade pode garantir ao menos os 15 minutos.
Mas mais que a celebridade, o tema da novela é a inveja que ela desperta nos que não são célebres. Fãs têm um pouco de rivais.
A boa índole da protagonista a torna alvo fácil da agressão, fruto de um misto de fascinação e inveja, que articula o culto às estrelas.
A ação do primeiro capítulo é exemplar: sequestro, perseguição policial, tiroteio, festival de fogos de artifício, incêndio, explosão, lancha e helicóptero.
Como em outras oportunidades, Gilberto Braga atua no fio da navalha entre a crítica moral -que reforça a existência do tapete vermelho, separando o universo dos "astros" do cotidiano das formiguinhas- e o cinismo que justifica o "vale tudo".


Esther Hamburger é antropóloga e professora da ECA-USP

CELEBRIDADE. Quando: seg. a sab., às 20h45, na Globo.

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