São Paulo, sexta-feira, 15 de outubro de 2004

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OUTROS LANÇAMENTOS

Ultra romantismo

Coisas Minhas - Lupicinio Rodrigues - 90 Anos
   

O senso comum sempre diz, do gaúcho Lupicinio Rodrigues (1914-74), que estamos diante de obra que é um monumento à dor de cotovelo, ao kitsch, à cafonice de bordel interiorano. O CD duplo "Coisas Minhas - Lupicinio Rodrigues - 90 Anos" dá chance de perceber que ele era bem mais que isso. Sob interpretações que vão dos clássicos Orlando Silva, Cyro Monteiro e Isaura Garcia aos modernos Paulinho da Viola, Fagner, Fábio Jr. e Arnaldo Antunes, a compilação varre vestígios de um imaginário pessoal torturado, ultra-romântico no sentido destrutivo e autodestrutivo do termo. As canções de Lupicinio compunham um inventário desenvolto da nata dos sentimentos românticos: culpa ("o remorso está me torturando"), amor desamoroso ("é melhor brigar juntos do que chorar separados"), amor masculino misógino ("a vergonha é a herança maior que o meu pai me deixou"), abandono ("Cadeira Vazia"), raiva ("Caixa de Ódio"), ressentimento ("eu não sei se o que trago no peito é ciúme, despeito, amizade ou horror"), morbidez ("quando a gente perde a ilusão deve sepultar o coração"), melancolia ("felicidade foi-se embora"). Sob a sombra de algumas das mais tocantes melodias de seu tempo ("Nervos de Aço", "Vingança", "Volta", "Exemplo", "Nunca", "Felicidade", "Dona Divergência"), Ardendo, o Lupicinio dos anos 40 e 50 espelhava a alma de um Brasil romântico, machucado, roubado de toda e qualquer experiência de auto-estima. Doía nele, dói na gente. (PAS)

ARTISTA: VÁRIOS; GRAVADORA: BMG; QUANTO: R$ 50, EM MÉDIA


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