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"ENTRE CASAIS"
O alemão Andreas Dresen traça cinzenta crônica do matrimônio
PAULO SANTOS LIMA
FREE-LANCE PARA A FOLHA
A calmaria no relacionamento humano, inexorável
e, por isso, assustadora aos amásios, é dos assuntos paquerados
pelo cinema, nesse seu infinito
flerte entre o real e o espetacular.
Porque do calvário de um casal
em crise surge um tobogã semelhante aos dos enredos de ação,
com os altos e baixos da cinematografia narrativa, mas sob chave
mais próxima da vida comum.
Quase como uma utopia de
amor "hippie", esta temática cruza fronteiras sob as mais variadas
chaves cinematográficas, do cinema independente norte-americano às comédias ou discussões
existenciais típicas do cinema
moderno dos anos 60. "Entre Casais", de Andreas Dresen, é bom
exemplo desta promiscuidade de
referências intercontinentais.
Uwe (Axel Prahl) não é mal
com sua mulher, Ellen (Steffi
Kühnert), mas de uma rudeza e
mau-humor insuportáveis, típicos de um casamento de 13 anos.
Christian (Thorsten Merten) e
Katrin (Gabriela Schmeide) tiveram a freqüência sexual interrompida, fruto também das milhas rodadas sob o mesmo teto.
Em crise conjugal severa, Ellen e
Chris acabam tendo um caso.
Evento gravíssimo, uma vez que
todos são amigos fidelíssimos.
Não demora para que os consortes saibam.
E aí o filme de Dresen ganha
corpo, abandonando a tentativa
de ser "indie" americano -que
sempre cria pontes entre personagem e espectador- e mergulhando num distanciamento cirúrgico, vizinho do Dogma 95,
com exposição igual dos personagens na tela, sem expor claramente as motivações dos maridos e
mulheres.
O espectador, lógico, sente-se
traído e órfão, sem afinidade alguma com esses dois casais de
chatos. Ainda que leve, o filme
agride os estômagos acostumados com uma gastronomia dramatúrgica que elege os simpáticos e boas-praças da trama. E
aqui não há homem e mulher
charmosos, mas sim seres humanos opacos.
Talvez a intenção do diretor
Dresen fosse somente a jocosa
crônica comportamental americana, mas "Entre Casais" acaba
por ser um (até curioso) "frankenstein" sobre o naufrágio da
monogamia matrimonial.
Entre Casais
Halbe Treppe
Direção: Andreas Dresen
Produção: Alemanha, 2002
Com: Steffi Kühnert, Gabriela Maria
Schmeide, Thorsten Merten
Quando: a partir de hoje no Top Cine
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