São Paulo, sábado, 15 de dezembro de 2001

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CRÍTICA

O cronista do cais do porto de Santos

ARTICULISTA DA FOLHA

Apesar de as crônicas serem o ponto de partida de "Plínio Marcos - A Crônica dos que Não Têm Voz", sua história no teatro é retratada como o achado de Patrícia "Pagu" Galvão, que procurava um palhaço para um espetáculo a ser montado em Santos. Foi ela a primeira a ler um texto teatral de Plínio, "Barrela". Pagu escreveu artigos comparando sua nova descoberta a Nelson Rodrigues.
Já o cronista Plínio Marcos foi uma "invenção" de Samuel Weiner, diretor do extinto jornal "Última Hora", que o contratou depois dos sucessos de "Dois Perdidos numa Noite Suja" (1966) e "Navalha na Carne" (1967).
"Para ser honesto, eu entrei pro jornal porque um amigo meu cismou que eu podia dar o recado diário. De saída, me acanhei. Nem de leve pude supor que conhecesse tantas histórias para garantir uma produção de seis laudas diárias", escreveu Plínio, em 1972.
Considerado maldito, "uma pedra no sapato das elites", escrevia usando o dialeto de sua gente e abusando de palavrões. "Eu, como repórter de um tempo mau, fiz a terra tremer várias vezes."
Foi colaborador da Folha, do "Diário da Noite", do "Diário Popular", da "Realidade" e da imprensa alternativa. Não parou de publicar até morrer, há dois anos, quando escrevia para a revista "Caros Amigos". Plínio chegou a ser "empurrado" para a função de crítico de cinema por pressão da censura, apesar de confessar que era "contra as discussões estéticas". Nos anos 80, quando estudava tarô, teve uma coluna sobre esoterismo no "Diário Popular".
"Eu sei de mim muito pouco. Mal me vejo e quase nem me reconheço. Em que atalho do caminho me perdi? Por que minha consciência está entorpecida? Por que só raras vezes a velha chama me brota no peito? Eu me abro com todos. Se eu não for sincero, estou para sempre perdido", escreveu em "Última Hora".
O livro retrata a vida e a obra de Plínio por meio de suas crônicas: seu começo como palhaço de circo, seu encontro com Pagu nos anos 50 e o ostracismo. Tinha a injustiça social como tema prioritário. Se Bertolt Brecht dizia "só um vidro separa o pão da fome", ele replicava: "Mas existem as metrancas protegendo esse vidro...".
Foi o primeiro a reclamar de racismo em telenovelas, a expor os abusos da lei do passe "que escraviza o jogador" e a retratar um homossexual sem os estereótipos da época. Foi o autor mais censurado de um "tempo mau". Chegou a vender livros de sua autoria para sobreviver. "Eu nasci para ser o cronista do cais do porto de Santos. E juro por essa luz que me ilumina que vou ser", escreveu.


Plínio Marcos - A Crônica dos que Não Têm Voz
    
Autores: Javier Contreras, Vinícius Pinheiro e Fred Maia
Editora: Boitempo
Quanto: a ser definido




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