São Paulo, domingo, 16 de maio de 2004

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CRÍTICA

"The O.C." crê na adolescência sem fim

BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA

Com o final de "Friends" e de "Sex and the City", o público jovem adulto fica praticamente órfão de seriados. Aqui, o último capítulo das aventuras de Ross e seus amigos ainda irá ao ar em julho na Warner, mas é só uma questão de (pouco) tempo. Depois disso, com a possível exceção de "Will & Grace", não há mais nenhuma série específica para os telespectadores entre os 20-e-poucos e 30-e-tantos no ar na TV paga brasileira, o que, ainda que de forma parcial e dessincronizada, reflete o cenário da TV americana.
A tentativa de criar o novo "Friends" a partir da aclimatação do britânico "Coupling" foi tão malsucedida que a série não durou mais do que uma temporada. A aposta era mesmo bisonha de início e, dado que o puritanismo norte-americano exigia que o conteúdo sexual dos diálogos fosse abrandado, pouco sobrava em "Coupling" que fosse capaz de tomar o lugar de "Friends". "Will & Grace", por sua vez, teria tudo para tornar-se a bola da vez -é engraçado, tem apelo pop, os atores são carismáticos etc.-, não fosse o fato de ter como protagonista um homem gay, o que, por incrível que pareça, ainda restringe a audiência.
A essa altura, a incrível indústria de ficção seriada norte-americana talvez esteja incubando mais de um projeto para tentar fazer o sucessor de "Friends".
O "spin-off" (série que tem origem em personagem de uma outra série) "Joey", com o ator Matt LeBlanc, pode até ter melhor desempenho que as desastradíssimas tentativas pós-"Seinfeld", mas certamente não repetirá o sucesso de "Friends".

Adultos adolescentes
Enquanto não aparece o herdeiro de "Friends", o truque é fazer séries adolescentes com ar de adultas, como "The O.C.". A sitcom que se passa numa daquelas cidades da Califórnia que parecem criadas em laboratórios, onde todo mundo é bronzeado, sarado, bombado e corrigido pela cirurgia plástica, vem se tornando uma espécie de surpresa de audiência, tanto lá nos EUA quanto cá.
O segredo da série talvez esteja em criar um ambiente em que os adolescentes parecem muito mais velhos e adultos do que sua idade e os adultos parecem muito mais jovens do que são. De certa forma, ali, pais e filhos aparentam estar separados não por uma diferença de geração, mas por uns poucos anos de idade, pelo peso da conta bancária e pela quantidade de intervenções estéticas já acumuladas.
É uma espécie de paradoxo, que responde diretamente à tendência contemporânea de acreditar no mito da adolescência sem fim, da eterna imaturidade que permite às relações pessoais manterem um altíssimo grau de individualismo e de descompromisso, ao mesmo tempo que promove a autonomia de escolhas (sobretudo de consumo) e o endurecimento da personalidade cada vez mais precoces.


@ - biabramo.tv@uol.com.br


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