São Paulo, sexta-feira, 16 de junho de 2000


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NOITE ILUSTRADA
Está com dor na perna até agora? Então você foi ao Skol Beats! ERIKA PALOMINO

VOCÊ dançou feliz da vida como se não houvesse mais nada em volta? Andou para lá e para cá e se perdeu dos amigos? Ouviu seu DJ favorito e algum outro que nunca tinha ouvido antes? Sentou na grama, deu risada, distribuiu abraços e está dolorido até agora? Então você foi ao Skol Beats.

AQUI estamos, então, ainda meio amassados, mas inteiros. E que delícia é o assunto entre todos (tirando as tristezas do dia-a-dia do Brasil). O que você achou do Skol Beats? O festival, sim, era um festival, e não uma rave, aconteceu na semana passada e já nasce como divisor de águas mesmo, por sua estrutura, até então nunca vista, pelas experiências que provocou, pela qualidade dos artistas envolvidos.

PARA começar, a maluquice de ser um evento em plena pista do autódromo de Interlagos (e eu ainda pus o carro num lugar que, para chegar, atravessava um pedaço da pista em si). A chegada tinha uma visão, assim, panorâmica de tudo, com as quatro tendas gigantes mais as pontas dos fios repuxados da área VIP. Bem, daí começa a parte subjetiva da coisa. E vale lembrar que noite é sempre algo subjetivo. Houve quem achasse a estrutura das tendas meio mambembe. A mais bonita, de fora, era a de tecido repuxado, da sala dos convidados, mesmo. A de house tinha uma casinha meio esquisitona na porta, cada uma com uma luz. Um bungee jump numa grua, tipo tosco, distraía a atenção dos olhos com um daqueles brinquedos que giram, com cara de parque de beira de estrada. Nada muito elaborado, idem para as tendinhas "fashion", com araras de roupas tipo clubber. Nem precisava.

NUMA tenda que era área de convivência, a tal com o chão xadrez, quando fui, um dos pufes gigantes já estava furado, com milhares de bolinhas de isopor no chão. Com o povo todo esparramado, não achei grande coisa também. Na tenda VIP, em si, umas cadeiras de plástico e umas coisas penduradas tipo aquário (peixes gigantes e algas), bares e um DJ com som mais fofinho para derreter. Nem fiquei ali, já que essa era a localização mais distante do centro de tudo.

ESSE é o próximo tópico: as tendas realmente ficavam distantes umas das outras (a organização diz que foi de propósito, para evitar tumultos entre elas, o que de fato não ocorreu). Então a idéia de ir de um lugar para o outro para ouvir alguma outra atração não rolava muito. Para passar da tenda de house para a de tecno, por exemplo, você saía lá de baixo e encarava uma subidona ou pegava um atalho pelo meio de uns pneus, subia mais um morrinho e lá chegava. Exercício clubber, eu digo. E, senso de direção à parte (que eu já não tenho, diga-se), com as pessoas que a gente conversou, tirando uma passada ou outra em tendas com gêneros musicais que não fossem o da sua preferência (antes de sair de casa), a maior parte do povo elegeu duas tendas e ficou de uma para a outra. Não dava para ir a tudo, mas é assim mesmo. Já se esperava esse tipo de frustração mesmo antes de sair de casa.

UMA coisa que aconteceu foram algumas alterações definitivas de line-up, o que atrapalhou algumas pessoas, confundindo. Então nem foi de tanto uso o colar com os cartõezinhos com a ordem de tudo, tenda por tenda. Parece que em Curitiba os DJs Westbam e Bob Sinclar tocaram para pistas ainda enchendo e reclamaram, e os organizadores mexeram então na ordem de entrada do povo. Somem-se os atrasos e empastelou tudo. A brincadeira era ir de uma tenda para a outra imitando o comercial da TV: vamos na pista raúse? Vamos na de téchino? (os puristas, xiitas e estudiosos odiaram a publicidade).

IMPRESSIONISMOS à parte, diz que foi mesmo a mais cheia a noite toda, até o final. Marky Mark garante que a pista de drum'n'bass foi a última a fechar e ficou até as 10h.

RAMILSON MAIA deu show na tenda de drum'n'bass, como se estivesse em casa, com banda ao vivo dando o peso que o gênero pede.

QUEM reparou na montagem gostou menos da pista de house, mas criticou a pista de tecno, que era praticamente em declive (acho que por isso a gente está tão dolorido, né?). Para o povo com quem conversamos durante a semana e no próprio evento (veja: não é uma pesquisa, não é veredicto oficial!!!!), Green Velvet, Frankie Knuckles e Fabio foram os melhores internacionais.

OS DJs nacionais respectivos a seus gêneros, por sua vez, foram tratados pelo público com o maior carinho, respeito e admiração. Mau Mau entrou depois de Green Velvet e comandava o povo amarrotado ali na pista tecno com cada cena de braço; Felipe Venancio passou o som para Frankie Knuckles em clima de Natal, e Marky quebrou tudo quando entrou. Frankie Knuckles fez o que quis e o que não quis com a gente, mostrou a essência da cultura house, amiga, receptiva, universal. Tocou vocal, baixou o BPM, encontrou frequências lindas e usou samples inesquecíveis como em "Where Love Lives". Tudo tão incrível e com atmosfera tão boa que nem lembrei que o Green Velvet estava detonando lá em cima na pista tecno. Saímos correndo e ainda o pegamos com seus vocais esquisitos, sua figura futurista e sua cara de mau. Muito bacana, sombrio, atmosférico e intenso.

STACEY Pullen diz que não rolou. Mau Mau estava tocando mais pesado, ele entrou mais fofo, o horário já avançava e tipo não rolou. NÃO fez história no evento.

AGORA, uó, uó, uó foi a Salomé da Bahia. Supermontada, ela entrou com o Bob Sinclair superfora do horário, superfora de hora. Cantou um pouco, umas coisas brasileiras que já não tinha mais nada a ver ali, depois do Frankie Knuckles. Ficou um tempão (ou o que parecia ser um tempão). Quando finalmente saiu, pensamos que levaria junto o Bob Sinclair em si, mas ele começou a tocar como se nada tivesse acontecido e foi enchendo aquela linguiça mansa. Claro, houve músicas legais, uma ou outra coisa francesa mais descolada, mas nada de criar comoção, e umas discos com house meio chatas.

TODO mundo começou a fazer aquela horinha para esperar o Armand van Helden. Confesso que ainda pensei em ouvir o Stacey Pullen, mas olhei para tudo o que tinha de subir e minhas pernas se recusaram a obedecer ao (fraco) comando do cérebro. Então esperamos o cara (foi muito legal no meio do Frankie Knuckles quando ele chegou ali atrás na cabine e só de aparecer fez o povo bater palmas). E ele entrou mal para caramba, com um tipo de house acessivelmente inglesa, sem muito carisma, sem muita vontade. Meio decepcionante mesmo.

BEM, o equipamento de som era incrível. Nenhum DJ reclamou (e olha que eles reclamam de tudo). Ao contrário, até. Diz que os retornos eram estéreo e tudo funcionava perfeitamente, das agulhas aos modernos mixers disponíveis. O toca-discos da sala VIP pulou uma hora e foi imediatamente trocado.

NOTÍCIA boa: não teve uma briga, uma confusão. Houve apenas oito casos de pessoas precisando de glicose na veia, mas nenhum boletim de ocorrência. Sinal de civilidade. Sinal que mistura de público não quer dizer intransigência ou intolerância. E sabe quantas pessoas? A organização do evento anuncia 20 mil.

FIQUEI passada com três drags meio Priscilla, com uns tamancos de plataforma gigantes e umas roupas esvoaçantes, que tentavam caminhar na buraqueira do gramado de Interlagos. As muié também sofreram. Mas o pior modelón do festival foi mesmo o de uma amapô meio fadinha, com uma saia longa de tule branco. E, no domingão, teve confraternização com todos os DJs na churrascaria Barbacoa e todos saíram de lá e foram andando até o Jazzy, que já estava fechado. E diz que faltaram cestos de lixo. E diz que faltou aspirina, neosaldina ou coisa que o valha nos postos médicos. Eu também precisei, e a Drika me deu uma, salvando minha vida ali no meio da Salomé. E foi simpático, friendly, o espaço para DJs iniciantes ali perto da área fashion. Agora, a maquiagem raver era uó. A parte das comidas não rolou. Chegou uma hora que era só fritura, pastel, pipoca com manteiga...

BOM, semana que vem tem mais confraternização.

QUARTA tem o lançamento do selo do DJ Luiz Pareto, no antigo prédio da Rede Globo, na praça Marechal Deodoro, em Santa Cecília. O selo se chama Rebolado e é de house. Virão dois DJs ingleses de tech-house, Eddie Richards e Asad Rizvi. Pareto também toca. Vai lá.
E domingo, você já sabe: tem parada de orgulho gay na Paulista. Tem de ir. Mesmo se você não for gay. Apareça lá para dar uma força e mostrar que há espaço para amor, convivência e tolerância entre as pessoas. Coisa que o Skol Beats, por exemplo, mostrou por meio da música. Ninguém precisa ser igual, mas todo mundo pode ser diferente.
E-mail - palomino@uol.com.br


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