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SEGURANÇA MÁXIMA
Obras como "Estação Carandiru" não circulam em biblioteca da penitenciária de Presidente Bernardes
Regime disciplinar proíbe livros a detentos
MARCELO RUBENS PAIVA
ARTICULISTA DA FOLHA
A vida é solitária em presídios
de segurança máxima do Estado,
os CRPs (Centros de Readaptação
Penitenciária). Além de visitas
monitoradas aos domingos, o
único contato com o outro lado
dos muros é a literatura.
Assim dita o RDD, Regime Disciplinar Diferenciado, empreendido em presídios como o de Presidente Bernardes (589 km de São
Paulo), em que romances como
"Lembranças da Meia-Noite"
(Sidney Sheldon), "O Alquimista"
(Paulo Coelho) e "O Xangô de Baker Street" (Jô Soares) compõem
uma biblioteca de 1.100 livros.
No entanto, não é qualquer obra
que atravessa a tranca. A escolha
passa por um controle exercido
pelo diretor do presídio, Antônio
Sérgio de Oliveira. "Estação Carandiru" (Drauzio Varella) e "Cidade de Deus" (Paulo Lins) estão
fora do acervo.
Além de chamar os funcionários de senhor e de abaixar a cabeça durante a revista, os detentos,
como o traficante Luiz Fernando
da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, e Wanderson Nilton de Paula Lima, o Andinho, acusado de liderar sequestros e da morte do
prefeito de Campinas, Toninho
do PT, só saem das celas individuais para uma hora e meia de banho de sol por dia e não têm direito a rádio, TV, revistas e jornais.
"Fazemos uma seleção rigorosa.
Evitamos livros de guerrilha, que
ensinam técnicas de combate. Os
caras que estão aqui não são os
melhores. Não queremos que eles
continuem com sua mentalidade", diz Oliveira. "Já apreendi um
livro que mostrava como assaltar
bancos, fazer atentados. Um familiar tinha mandado." Oliveira,
responsável pela guarda de 49 detentos, afirma que toma o cuidado de ler antes as obras que os detentos encomendam.
Para o secretário de Administração Penitenciária, Nagashi Furukawa, a livre circulação de livros pode conturbar a rotina prisional: "A gente não entrega os livros enviados pelos familiares,
porque, muitas vezes, eles tentam
levar mensagens cifradas marcando páginas, destacando frases.
Livros como "Estação Carandiru"
ou sobre a fundação do Comando
Vermelho não entram, porque
evitamos obras que falem do sistema penitenciário. Eles serviriam para agitar os ânimos. Basicamente temos romances não ligados à vida prisional".
Furukawa afirma que não vê
desrespeito a direitos dos presos.
"É um regime especial. Não vejo
como violação de nenhum direito. São três as penitenciárias com
RDD, em Taubaté, Avaré e Presidente Bernardes."
Rigor no controle
"Não sei o que dizer, conheci
um destes presídios, e a disciplina
é duríssima. Em princípio, sou
contra censura. De um modo geral, acho o meu livro leve. E eles lá
conhecem mais detalhes do que
eu, é a rotina deles", diz Drauzio
Varella.
De acordo com a advogada Dora Cordani, o controle acarreta
uma restrição além da prevista
em lei. "Não acho justo, não acho
razoável e nem sequer legal. Embora a Lei da Execução Penal (lei
7210/ 84) preveja constituir direito o contato com o mundo exterior por meio da leitura e de outros meios de informação. Acredito que o detento não deve sofrer
outras restrições à sua liberdade
que não aquelas expressamente
previstas em lei."
Segundo Cordani, presidente
do Instituto de Defesa do Direito
de Defesa, entidade formada por
advogados, a Constituição assegura o respeito à integridade moral do preso (art. 5º, inc. 49).
A advogada diz que a resolução
editada pelo Conselho Nacional
de Política Criminal e Penitenciária, que trata de regras para o tratamento do preso no Brasil, estipula a obrigatoriedade dos presídios manterem uma biblioteca
sem contudo reproduzir o senso
de "bons costumes".
"Não me parece razoável creditar à direção dos estabelecimentos penitenciários o poder de decidir o que constitui ou não leitura
adequada aos internos, sob pena
de se criar mecanismo injusto de
censura, que em nada colabora
para a ressocialização do detento", afirma.
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