São Paulo, sexta-feira, 16 de agosto de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CINEMA/ESTRÉIA

"AS TRÊS MARIAS"

Subestiloso, Abranches não tem inquietação trágica a compartilhar

MARIO SERGIO CONTI
DA SUCURSAL DO RIO

A primeira cena de "As Três Marias" é estupenda. Numa rocha altíssima e vazada, com uma vasta planície ao fundo, uma mulher e um homem discutem, sem que se escute o que dizem.
A imponência da paisagem, as figuras humanas diminutas e o desconhecimento dos motivos do antagonismo do casal têm um mistério que extravasa o impacto visual. A partir daí, o filme piora, piora, piora a ponto de não sobrar quase nada, nem a grandiloquência das imagens.
O enredo do filme é esquelético. O viúvo Firmino Santos Guerra (Carlos Vereza) tenta reconquistar Filomena Capadócio (Marieta Severo), com quem teve um caso na juventude. Ela não topa. Pelo bom motivo que, além de não estar apaixonada pelo ex-namorado, é casada e tem cinco filhos. Santos Guerra manda então que seus dois filhos matem o marido e os dois filhos de Filomena.
Seria o caso de indagar por que os filhos de Santos Guerra acatam passivamente a ordem, dado o motivo fútil do pai. Mas a pergunta não tem cabimento porque o diretor Aluizio Abranches é ferozmente anti-realista e quis fazer uma parábola de alcance mítico. Para se vingar, a recém-viúva manda que suas três filhas contratem sertanejos para dar cabo de Santos Guerra e seus filhos.
As três moças, as Marias do título, contatam os matadores. Acontecem imprevistos e as filhas cumprem elas mesmas a ordem materna.
Qual seria a moral dessa história? Que o matriarcado é tão violento quanto o patriarcado? A miserabilidade do enredo se contrapõe à untuosidade das interpretações e personagens, que parecem saídos de uma antologia de esquisitices. Um matador não fala com mulheres e usa cobras para assassinar. Outro está preso e fala por meio de citações bíblicas. O terceiro é um policial que foi mordido por um cão hidrófobo.
Já as Marias são cocotas perdidas no sertão. Dirigem carros incrementados, vestem minissaias e andam de salto alto na caatinga. Impera a gratuidade.
Aluizio Abranches não tem nenhuma inquietação trágica a compartilhar com a platéia. Ele é apenas subestiloso. Fez um sub-faroeste à maneira de Robert Rodriguez, que, por sua vez, é um sub-Tarantino.


As Três Marias  
Produção: Brasil, 2002
Direção: Aluizio Abranches
Com: Marieta Severo, Julia Lemmertz e Maria Luisa Mendonça
Quando: a partir de hoje nos cines Frei Caneca Unibanco Arteplex 5, Internacional Guarulhos 15, Market Place 2 e Top Cine 2



Texto Anterior: Crítica: Um dos melhores filmes do ano, ponto
Próximo Texto: "Vou Para a Casa": Manoel de Oliveira faz elogio ao recomeço
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.