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ARTES PLÁSTICAS
Wim Delvoye dá
novo valor à imagem
Reprodução/ Folha Images
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'Mike, Dinner Is in the Oven, Jill', obra em jato de tinta sobre tela feita a partir de fotografia retrabalhada, presente na mostra
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CELSO FIORAVANTE
da Reportagem Local
Montanhas com recados gigantes fixados, porcos que passeiam
com suas belas e extravagantes tatuagens, azulejos com arabescos
criados a partir de uma mesma
imagem de merda, vulneráveis redes de futebol em vidro.
É essa combinação insólita e bizarra de elementos que rege o trabalho do artista belga Wim Delvoye, que inaugura hoje sua primeira
exposição no país, na galeria Luisa
Strina.
Pretende que as imagens readquiram suas forças, perdidas com
a superexposição pela mídia. Quer
ainda que a arte seja mais comunicativa, como explicou em entrevista à Folha.
Folha - Existe sempre uma certa
ironia em suas obras. O que você
quer provocar no seu espectador?
Wim Delvoye - A ironia é uma
forma de se dizer a verdade, mas
com mais liberdade. É a única arma que pode ser usada por alguém
que não está em uma situação de
poder, que não tem esse poder. É o
contrário do cinismo, que é um
discurso usado de cima para baixo, por quem detém o poder. O cinismo de hoje difere do cinismo do
filósofo grego Diógenes, o "kynismós", que também era um discurso de baixo para cima.
Folha - Por que você usa imagens
clichês ou pelo menos reconhecíveis? É uma estratégia para tornar
seu trabalho mais popular?
Delvoye - Quando inicio um
trabalho, não penso se ele vai ser
arte ou não. Penso apenas em fazê-lo bem. Se eu me questionar antes, serei menos livre, pois adquirirei todos os cânones e clichês daquilo que seja arte.
Também penso na competição
da arte com outros tipos de linguagens. Para sobreviver, a arte precisa se comunicar e, por isso, minha
arte deve funcionar fora do contexto criado pelas paredes brancas
de um museu.
Meus objetos podem se comunicar com as pessoas mesmo depois
de voltar para o contexto original
de onde saíram. Elas continuam
igualmente estranhas, mesmo fora
da proteção do museu.
Folha - As situações bizarras criadas pela reunião de elementos díspares tornam os trabalhos mais
populares?
Delvoye - Cada peça minha
busca algum tipo de reflexão no
espectador. Na peça "Mosaico"
(utilizada como fundo desta página), por exemplo, existe um contraste entre a merda, que é o caos,
com a limpeza do azulejo. Um
grande investimento de tempo da
humanidade é feito com a higiene.
Já a merda mostra que somos basicamente iguais, que não existem
diferenças de cor, sexo, religião...
"Mosaico" é um tapete oriental,
que pode nos representar.
A combinação de duas coisas em
oposição acaba sendo formalmente lógica, como uma rede de futebol construída com vitrais. Ambos
não perderam suas características
originais, sua integridade. São casamentos perfeitos. O vitral ficou
ainda mais frágil depois de inserido no contexto futebolístico. Lembramos mais da fragilidade do vidro e da violência do futebol.
Folha - Seus trabalhos sempre lidam com oposições: cultura e natureza, o bom e o mau gosto, o público e o privado, o frágil e o violento. Por que esse tipo de dicotomia lhe interessa?
Delvoye - A publicidade usa essas estratégias diariamente, como
a Coca-Cola, que coloca esquimós
no Saara. Trabalho com as teses de
Heráclito, que definiu o mundo a
partir da luta entre oposições, e de
Hegel, com sua "tese e a antítese".
É preciso o calor para compreender o frio, o vermelho para ver o
verde, ter fome para saber o valor
da comida.
Procuro símbolos que tenham
uma conotação forte antes de incorporá-los: rede de futebol, porcos, tatuagens... Com o atual bombardeamento de imagens pela mídia, nos tornamos imunes a elas. É
preciso procurar imagens fortes
para que elas voltem a funcionar.
Folha - Existe uma cultura belga
em seus trabalhos? A escatologia
faz parte dela?
Delvoye - Não tenho consciência disso, mas é interessante notar
que o símbolo de Paris é a torre
Eiffel, o de Nova York é a estátua
da Liberdade, o do Rio é o Cristo
Redentor. Já o de Bruxelas é uma
escultura de menos de 50 cm que
fica escondida em uma esquina e
que mostra um menino que mija.
Procuro trabalhar com elementos que representem formas de democracia, como a merda. Mesmo
o porco, ele nunca foi considerado
o rei dos animais...
Folha - Ao recontextualizar elementos do cotidiano e imagens,
você se sente mais próximo da arte
pop de Andy Warhol ou do dadaísmo de Marcel Duchamp?
Delvoye - Vejo o desenvolvimento da história da arte como um
pêndulo. A arte pop e o dadaísmo
são dois pontos de um mesmo movimento. A arte pop é mais naif,
mas eu prefiro o dadaísmo, que é
mais europeu, mas não utilizo o
conceito de "ready-made".
Quando utilizo um objeto, a
obra de arte não está pronta. Eu
preciso sempre trabalhar em cima
dele e de uma maneira artesanal
para que se torne arte. O
"ready-made" era totalmente
contrário à idéia de artesanato.
Atacava, por exemplo, a pintura,
que, justamente por suas conotações artesanais, de ser feita com a
mão, foi atacada em vários momentos do século 20.
Mostra: Wim Delvoye (jato de tinta sobre
tela e objetos)
Onde: galeria Luisa Strina (r. Padre João
Manuel, 974A, Jardins, tel. 011/280-2471)
Vernissage: hoje, às 19h
Quando: de segunda a sexta, das 10h às
20h; sábado, das 10h às 14h. Até 11 de
outubro
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