São Paulo, Terça-feira, 16 de Novembro de 1999
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CINEMA

Alain Fresnot fala sobre seu terceiro longa

Brasil de 1555 chega às telas em 2000

Paulo Giandalia/Folha Imagem
O cineasta Alain Fresnot, que prepara para 2000 o filme "Desmundo", história de amor passada no Brasil de 1555


IVAN FINOTTI
da Reportagem Local

Apesar de ter trabalhado em mais de três dezenas de filmes desde 1981, o cineasta Alain Fresnot parecia estar relegando uma parte de sua carreira: em 18 anos, assinou como diretor apenas dois longas-metragens em 35 mm.
"Desmundo", filme que prepara para 2000, vem subverter essa periodicidade e se juntar a "Ed Mort", lançado em 97, e a "Lua Cheia", de 88. "Um a cada dez anos...", comenta Fresnot. "Espero que agora se torne mais frequente."
"Desmundo" ainda está em fase de captação -o orçamento é de R$ 4,3 milhões- e deve ser filmado na metade do ano que vem. A produção é da A.F. Cinema e Vídeo, empresa responsável por títulos como os premiados "Kenoma" e "Através da Janela" e o ainda não-lançado "Castelo Rá-Tim-Bum" -eis aí o que Fresnot andou fazendo enquanto não dirigia os seus próprios.
A nova fita, baseada em livro homônimo de Ana Miranda (Cia. das Letras, R$ 24), conta a história de Oribela, uma das adolescentes órfãs portuguesas mandadas ao Brasil em 1555 para prover os senhores de engenho de "carne branca", por assim dizer.
Em "Desmundo", Fresnot pretende não apenas contar a história de Oribela, mas mostrar cenas de cunho histórico. Leia abaixo entrevista com o diretor.

Folha - O que significa "Desmundo"?
Alain Fresnot -
É o nome do livro da Ana Miranda, que deu origem ao roteiro. Pela concepção do livro, e dos europeus do século 16, o mundo era o Hemisfério Norte. Abaixo do Equador era o inverso, o contrário do mundo, o antimundo ou desmundo.

Folha - Como conciliar cenas históricas com uma história de amor?
Fresnot -
O filme é um diário da adolescente Oribela, mas a parte histórica não é um pano de fundo para a trama. O que Oribela sofre são exatamente as condições do início do século 16. Até a década de 30, em vez de os portugueses civilizarem os índios, eles é que se "indianizavam". Até essa época, o Brasil era muito largado. Tinha poucos europeus. Como os franceses rondavam muito por perto, começaram as grandes expedições.

Folha - E é nessa época que o filme se passa?
Fresnot -
O filme se passa nos anos 50, quando a menina é largada no Brasil. E isso é um fato histórico mesmo. Os jesuítas pediram para Portugal mandar meninas brancas, porque os portugueses estavam se misturando muito com as índias. Existem cartas do padre Manoel da Nóbrega pedindo órfãs.
A inter-relação, no filme, entre o que seria antropológico e o que é da menina se dá pela vida dela. Ela chega, é direcionada para um senhor de engenho. Ele tira ela da praia, ela não quer ir. Ingenuamente, ela tem uma primeira fuga. Quando chega na vila, não tem mais a nau. O cara que gosta dela é um bandeirante, rude, que vai fazer um apresamento numa aldeia indígena. A parte de figurino e cenografia não começou ainda, mas a idéia é ser o mais fiel possível, apesar de ser um período muito pouco conhecido.

Folha - Essa fidelidade se reflete nas falas em latim, hebraico e tupi antigo, certo?
Fresnot -
Isso é porque os índios falam em tupi e os jesuítas rezam em latim. Os cristãos novos, os judeus convertidos à força durante a Inquisição, alguns deles ainda falavam hebraico ao chegar aqui. Essas falas não são essenciais na compreensão da história, então não haverá legendas. É um filme muito pouco falado. É visual, muita ação e pouco diálogo.

Folha - É uma boa hora para um filme como esse devido à comemoração dos 500 anos do Descobrimento do Brasil, certo?
Fresnot -
Sim, mas não foi feito no sentido oportunista da coisa. Eu comprei os direitos em 96, logo que saiu o livro. Nem estava ligado no caráter de efeméride.


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