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MÚSICA/ARTIGO
Quatro décadas e uma tarde com o Rei
NELSON MOTTA
COLUNISTA DA FOLHA
Vi e ouvi Roberto Carlos pela primeira vez no início dos
anos 60, magrinho, desconhecido
e cantando bossa nova num apartamento em Copacabana, a poucas quadras do Copacabana Palace, onde o Rei fez anteontem o
lançamento de seu novo disco
com uma audição e uma entrevista coletiva.
Quatro décadas separam o garoto de voz doce e olhar tristonho
do homem maduro, carismático e
com o poder de seduzir qualquer
platéia em qualquer lugar, que vejo entrar sorridente para responder às perguntas dos jornalistas.
Mas a doçura da voz e o olhar
comovente continuam os mesmos daquela noite distante em
que ele iniciava sua carreira de
cantor e eu era um fã de João Gilberto. Nas décadas seguintes, a
história dos sentimentos dos brasileiros pode ser contada por suas
músicas. No Brasil, ninguém, em
nenhum tempo, teve mais sucessos e foi mais querido do que ele.
A boa notícia é que Roberto está
cantando cada vez melhor, como
mostra o novo disco. Não que as
músicas sejam ruins, são quase
todas boas, mas certamente já
cantou melhores -e nunca cantou tão bem. Seu legendário perfeccionismo se justifica.
Para entender, basta ouvi-lo
cantar de novo "Meu Pequeno
Cachoeiro". Tudo é muito melhor
do que a sua clássica e já belíssima
gravação há mais de 30 anos, o arranjo, as sonoridades, a doçura e
fluência da voz, a emoção discreta, tudo ficou mais bonito agora.
Como nas recentes regravações
de seu mestre João Gilberto de
"Chega de Saudade" e "Desafinado", 40 anos depois, muito melhores que as históricas.
A coletiva foi muito divertida,
os salgadinhos e docinhos do Copa estavam deliciosos, Roberto
dominou geral, respondeu tudo
com charme e simpatia, como
sempre. A parte que mais gostei
foi quando ele falou de João Gilberto, quando o ouviu pela primeira vez, aos 17 anos, como tentava imitá-lo, como aprendeu
com ele, que sonha em tê-lo em
seu programa e já o convidou
duas vezes, uma vez João quase
foi, na outra quase-quase, e Roberto continua com fé em Deus
que um dia ainda ouviremos este
dueto que sintetiza quatro décadas de música brasileira.
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