São Paulo, quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

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Crítica/ "Avatar"

É convencional, mas não ingênuo

Longa, que entra em circuito na sexta, traz personagens capazes de viver duas vidas, em Pandora

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

"Avatar" é um desses filmes que podem se tornar vítimas da excessiva expectativa em torno deles. O que se espera de James Cameron, no caso, é uma revolução dentro da revolução do 3D digital. É uma história tão previsível como a de "Titanic" e tão inesperada quanto a de "O Exterminador do Futuro", ágil como um videogame, mas grave como um Bergman.
Evidentemente, "Avatar" não é tudo isso. Para começar, desenvolve mais ou menos todos os aspectos da convenção do filme de aventuras. Existe ali uma cientista em busca de fantásticas descobertas num planeta chamado Pandora. Ela trabalha, a rigor, sob as ordens de um militar, cujo objetivo é mobilizar forças terráqueas contra o povo primitivo de Pandora.
Inútil dizer, por trás do militar existe o financista, o interesse econômico: esse planeta possui um metal precioso e desconhecido no nosso tempo.
O filme não é ingênuo, porém. A ideia dos personagens capazes de viver duas vidas, a sua própria e a de duplo criado cientificamente é, embora não inédita, interessante e muito bem desenvolvida.
A saber: Jake Sully é um ex-soldado que se integra ao projeto Pandora após a morte de seu irmão gêmeo, cientista, cujo lugar deve ocupar. Jake é ignorante e paraplégico, portanto desprovido de maior mobilidade. Mas, ao tomar o lugar de seu duplo (adquirindo as feições do enorme povo de Pandora), ele readquire a mobilidade. Com isso, torna-se um duplo feliz. É melhor que seja, pois muitos são os perigos e mistérios de Pandora.
A desvantagem de "Avatar", como argumento, talvez seja o da excessiva legibilidade. Nesta fábula não é difícil traduzir Pandora por Iraque (do ponto de vista militar), por exemplo, um desses povos que os americanos se empenham mais por subjugar do que por compreender, tendo em vista interesses econômicos. Foi essa a marca do governo Bush, não foi?
Ao mesmo tempo, os habitantes de Pandora são uma espécie de bons selvagens extraterrenos, em plena harmonia com essa natureza que os terráqueos pretendem destruir. À frente deles, um coronel que é um clichê escarrado de militar (como, aliás, a imensa maioria dos militares reais).
Tudo até aqui parece conspirar para que "Avatar" não tenha a posteridade de "Titanic", por exemplo, um filme que cresceu com o tempo. No entanto,temos aqui uma história em completa sintonia com os desejos mais claros manifestados pela humanidade nos últimos tempos (sua sobrevivência, seu elo com a natureza, a compreensão do outro). Isso, dirão seus opositores, não compensa as quase três horas com máscara de 3D no rosto e o sacrifício imposto à visão. Pode ser.
Mas existe um tal cuidado no espetáculo, na produção das batalhas, que "Avatar" parece capaz por vezes de reinventar o cinema como espetáculo de pura mágica, que envolve o fantástico.
Ainda uma vez, porém, é obrigatório reconhecer que, apesar das virtudes do 3D, são os momentos contemplativos os melhores. A imagem da flor branca pousando no arco da guerreira é das mais poéticas deste filme, pesados todos os pesares, bem indispensável.


AVATAR

Direção: James Cameron
Produção: EUA, 2009
Onde: pré-estreia amanhã à noite
Classificação: 14 anos
Avaliação: bom



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