São Paulo, sábado, 17 de fevereiro de 2007

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Crítica/ensaio

Autora analisa intelectuais inconformistas com saudade inteligente

GILBERTO FELISBERTO VASCONCELLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Intelectual, parisiense, sofisticada, historiadora da psicanálise na França, que fez a ponte entre Marx e Freud, o amálgama freudo-marxismo, madame Elisabeth Roudinesco, nascida na geração 40-45, conheceu de perto e leu com afinco os principais pensadores franceses da atualidade exportados para o mundo.
Claro que não cabe a ela a responsabilidade de como é feita a recepção alhures desses pensadores. Uma coisa é o Deleuze francês, dando aula de filosofia durante 40 anos, outra bem diferente é o deleuzeano subempregado e volante em Buenos Aires ou São Paulo.
Os filósofos atormentados foram intelectuais críticos e corajosos, Sartre, Canguilhem, Foucault, Altusser, Deleuze, Derrida, todos levando vida materialmente confortável, mas barra pesadíssima, droga, birita, loucura, manicômio, assassinato, na seqüência do marxismo em crise, do proletariado problemático, do triunfo cósmico da direita endolarada, do colapso do partido positivo, do descaso pela militância, do engajamento desencantado, do ocaso da idéia de missão intelectual, do pragmatismo cínico de mercado.
Depois do desaparecimento dos filósofos na tormenta, sobrevem a maré abobalhada do conformismo e da resignação. O que vinga agora intelectualmente é a reza do dinheiro, ou senão a voga do pensamento teológico que caracteriza a etapa neoliberal do capitalismo em escala planetária.
A ideologia da segurança psíquica tomou conta da nossa época obcecada pela saúde e pela medicalização da existência, com a aliança sinistra e comercial entre a drogaria e o supermercado.
Envenenamo-nos com o mesmo produtor de comida que nos vende o remédio para a cura. Tão diferente disso era a admiração de Deleuze por Sartre: "É um polemista terrível... não existe gênio sem parodia de si mesmo. Mas qual é a melhor paródia? Tornar-se um ancião adaptado, uma autoridade espiritual e vaidosa?".
Os melhores capítulos são dedicados aos filósofos com quem conviveu como aluna e amiga, exercendo com estilo uma espécie de saudade à francesa, culta, racional, inteligente e grafomaníaca.


GILBERTO FELISBERTO VASCONCELLOS é professor de ciências sociais na Universidade Federal de Juiz de Fora.

FILÓSOFOS NA TORMENTA     
Autor: Elisabeth Roudinesco
Tradução: André Telles
Editora: Jorge Zahar
Quanto: R$ 36 (240 págs.)


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