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Resnais e Malmros se enfrentam em Berlim
AMIR LABAKI
enviado especial a Berlim
Duas tradições distintas do cinema europeu enfrentaram-se ontem na mostra competitiva do 48º
Festival de Berlim.
O francês "On Connait la Chanson" (Conhecemos Essa Música),
do veterano Alain Resnais, representou a produção de ruptura,
sempre empenhada em apontar
alternativas ao cinema hollywoodiano dominante. Já "Barbara",
do dinamarquês Nils Malmros,
defendeu o filme romanesco, baseado em trama clara e inegáveis
valores de produção.
Resnais aposta mais que Malmros e, mesmo se excedendo, levou
a melhor. "On Connait la Chanson" é por certo seu melhor filme
recente e não surpreende que tenha levado 12 indicações para o
César, o Oscar francês, que será
entregue no final deste mês.
O cotidiano de um punhado de
personagens da classe média parisiense é comentado por meio de
trechos de canções populares, dublados pelos intérpretes (Sabine
Azema, Lambert Wilson, Pierre
Arditi). Resnais celebra a obra de
Dennis Potter (1935-1994), o mais
importante escritor de telesséries e
telefilmes da Inglaterra. Potter
usava e abusava do efeito em programas já clássicos como "The
Singing Detective" (1986).
O cineasta homenageia a arte
considerada menor da música popular alçando-a ao posto de coro
da trama que serviu à psicologia
behavourista em "Meu Tio da
América" (1980). A ciranda romântica do entrecho serve impecavelmente ao propósito.
O resultado lembra "Todos Dizem Eu Te Amo" (1996), de
Woody Allen, e dialoga em sua
origem com "Veja Esta Canção"
(1994), de Carlos Diegues. Pena
que tudo se alongue demais e termine de forma burocrática. Tem
razão o crítico italiano Roberto
Silvestri, do "Il Manifesto": o filme
estava condenado a ter a duração
de ao menos dois CDs.
"Barbara", por seu turno, é o cinemão com grife. Malmros adapta
o romance homônimo de um dos
mais importantes escritores dinamarqueses deste século, Jorgen-Frantz Jacobseb (1900-38).
Totalmente passado nas Ilhas Faroe, do Atlântico Norte, o filme
acompanha a força destruidora
das paixões da volúvel Barbara,
viúva duas vezes já aos 28 anos.
Assiste-se, em fins do século 18,
ao velho embate sexo versus moral protestante. Não há espaço para surpresas, mas Malmros conduz tudo com segurança e fluidez,
e Anneke vom der Lippe, no papel
principal, torna palpável o poder
sedutor do personagem. É mais
uma candidata ao prêmio de melhor atriz, que tem Fernanda
Montenegro ("Central do Brasil")
como uma das favoritas.
O presidente do júri, Ben Kingsley, defendeu enfaticamente em
entrevista o cinema europeu. Louvou ainda a importância da renovação. Cumprida metade da disputa, fica cada vez mais difícil ao
Urso 98 seguir esse figurino.
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