São Paulo, segunda, 17 de março de 1997.

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CINEMA
Cineasta, que morreu sexta, aos 89, dirigiu os sucessos `Matar ou Morrer' e `A Um Passo da Eternidade'
Zinnemann morre sem deixar marca pessoal

INÁCIO ARAUJO
Crítico de Cinema

A morte de Fred Zinnemann -ocorrida sexta-feira, em Londres, aos 89 anos, por problemas cardíacos- interessa ao cinema, sem dúvida. Mas é o caso de perguntar: a que cinema?
Zinnemann foi um padrão de diretor hollywoodiano. Realizou alguns dos filmes mais célebres do cinema americano ("Matar ou Morrer", de 1951, "A Um Passo da Eternidade", de 1953), filmou algumas sequências que até hoje deixam os norte-americanos (e não só) boquiabertos.
Mas esteve longe de constituir o que se pode chamar "uma obra": um conjunto de trabalhos com um pensamento original e coerente e uma marca pessoal.
Nascido em Viena, em 29 de abril de 1907, Zinnemann trocou a Europa pelos EUA em 1929. Trabalhou como extra, foi assistente de direção de Robert Flaherty e realizou documentários para a Metro.
Fixou-se nos EUA e assumiu a nacionalidade norte-americana. Em 1942, dirigiu o primeiro de seus 21 longas, "Um Assassino de Luvas".
Sua principal marca, a ousadia na escolha dos temas, começou a se revelar em "A Sétima Cruz" (44), que narra a fuga de um antinazista de um campo de concentração.
Força da história
O caminho dos filmes baseados em temática forte estava traçado. Em 1951, "Matar ou Morrer" confirmaria esse destino: a glória de Zinnemann estaria, para sempre, associada à força das histórias que tinha a seu dispor.
"Matar ou Morrer" buscava um caminho fora do convencional para o faroeste. Gary Cooper ganhou o Oscar de melhor ator como o xerife que procura ajuda da população para combater os vilões que estão para chegar à cidade.
Zinnemann desagradou os cultores do gênero, ao criar um herói pouco heróico, que não se impunha pela individualidade, mas pelos laços de solidariedade que procurava criar com a população. O patriotismo passava à frente da épica fundada sobre o individualismo, característica do faroeste.
Com "A Um Passo da Eternidade", Zinnemann ganhou Oscars de melhor filme e direção e beirou a unanimidade. O filme pode ser inferior à sua fama (leia artigo abaixo), mas, seja pela sucessão de episódios, pela cena amorosa ousada, ou pelos 8 Oscars ganhos, afirmou o diretor em definitivo.
Ainda assim, pode-se morrer de tédio vendo "Cruel Desengano" (1952) ou "O Homem que Não Vendeu Sua Alma" (1966). Este último deu a Zinnemann seu segundo Oscar (de melhor filme e melhor direção, novamente), com a biografia de Thomas More e, sobretudo, sua oposição ao poder absoluto de Henrique 8º.
Já "O Dia do Chacal" (1973), em que relata um atentado contra o presidente francês Charles De Gaulle, prende a atenção todo o tempo, em parte porque Zinnemann, ao adaptar o romance de Frederic Forsythe, fixou-se na sucessão de detalhes sugerida pelo plano de assassinato.
"Julia" (1977), que adapta uma peça de Lillian Hellman, conta academicamente a história de amizade entre duas mulheres, durante a Segunda Guerra Mundial.
Quase todo o tempo, limita-se a valorizar as atrizes (Jane Fonda e Vanessa Redgrave). Mas uma sequência torna o filme memorável: quando Lillian (Fonda) vai à Alemanha nazista em busca de Julia.
Ali, Zinnemann impôs os detalhes à história. Naquele instante, o filme importa pelo que mostra, e não pelo que conta. Infelizmente, esses momentos foram sempre fugazes em Zinnemann. Como norma, seus filmes valem o que valem as histórias que conta.

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