São Paulo, sexta-feira, 17 de março de 2000


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DIRETOR ANTI-RACISTA
Trilogia de Jewison não ajuda a causa

especial para a Folha

Com perdão do trocadilho, é mais que justo dizer que o cinema do canadense Norman Jewison é essencialmente atrelado à ação da justiça sobre o homem.
Essa justiça às vezes é estampada como Justiça ("Justiça para Todos"), como moral institucionalizada ("Agnes de Deus"), como vingança ("Rollerball") e mesmo como divindade ("Jesus Cristo Superstar"). Mas o que deveria ser reto se entorta nos descaminhos da corrupção, do ódio e da violência. Daí Jewison optar por usar sua câmera no eldorado impossível, os Estados Unidos.
Mesmo com uma filmografia irregular, pode-se notar a condição do negro em três obras que desmascaram a hipocrisia.
Numa pátria repleta de brancos segregacionistas, os afro-americanos foram vítimas de todas as formas de violência. Diferente daquela que faz a ascensão da carreira do lutador Hurricane, o boxe. Violência maior será a dos policiais facínoras que vêem uma chance de colocá-lo na prisão.
"No Calor da Noite" (67) é seu filme mais famoso, apesar de "A História de um Soldado" (84) ser sua pequena obra-prima. "No Calor..." ganhou cinco Oscar, incluindo os de melhor filme e ator (para Rod Steiger).
Steiger faz um truculentíssimo delegado de uma cidadezinha sulista que, em princípio, teima na culpa de um negro pego numa estação de trem (Sidney Poitier), pois teria assassinado um milionário local. Mal sabe ele que o suspeito é um investigador, Tibbs, em visita à cidade. A dupla ainda terá de resolver o crime.
Já "A História de um Soldado" mostra Howard E. Collins Jr. na pele do capitão Davenport, um oficial negro que chega à Lousiana, durante a Segunda Guerra Mundial. Ele tenta investigar a morte de um sargento negro (Adolph Ceasar). Com o mesmo porte altivo de Denzel Washington ("Hurricane - O Furacão") e Poitier, esbarra na burocracia e no receio da oficialidade local de o assassino ser um branco.
Mas o resultado da trilogia do racismo de Jewison peca em delimitar os conflitos. Ele lança ingenuamente a idéia de que os sulistas não toleram os negros enquanto, no norte, estes estão totalmente inseridos na sociedade. Os blues, jazz, som de Bob Dylan e o humor que pontuam essas obras atenuam -nunca reforçam- a emergência de integração racial. O racismo parece coisa do passado, já remoto.
Daí a preciosidade desta trilogia estar no personagem Davenport, em princípio, o que menos se importa com o preconceito que sofre, sempre aderindo ao deboche. No final, ao saber que o assassino não fora um branco, o espectador pode notar suas lágrimas correndo o rosto, num choro contido que junta revolta, desespero e militância. Esta é a pérola que falta nos outros filmes de Jewison.
(PAULO SANTOS LIMA)


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