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TELEVISÃO
Série "50 Anos de TV" não
faz jus à grandeza do veículo
ESTHER HAMBURGER
especial para Folha
Os documentários comemorativos dos 50 anos de TV anunciam
a oportunidade rara, que se abre a
cada 10 anos, de rever momentos
da história da TV no Brasil. A Rede Globo deu a largada na última
quarta-feira com o primeiro episódio de uma série de programas
mensais. A produção da emissora
é divertida, mas decepcionante.
Mais uma vez fica evidente o descompasso entre o caráter público
da concessão de canais e o caráter
privado da manipulação de imagens que ao longo dos anos recheiam nosso cotidiano.
"A TV na Vida do Brasileiro"
acertou ao marcar o início das comemorações com uma incursão
no universo dos espectadores. O
lugar do aparelho nas casas, a mediação que a TV realiza entre as
gerações, a fascinação exercida
por cada um dos gêneros televisivos, a dramaturgia, o esporte, os
infantis, o jornalismo.
Uma garota expressa seu desejo
de conhecer outras épocas pelas
das novelas. Várias senhoras explicam sua vontade de ver histórias fantasiosas de amor. E uma
sequência memorável de cenas de
beijos através dos tempos marca a
exibição cada vez mais liberal da
sensualidade em imagens de felicidade romântica.
A escolha primorosa de cenas
que marcaram época inspira uma
vontade de ver mais. "A Praça da
Alegria", Hebe Camargo, o "Jornal de Vanguarda" são alguns
exemplos de imagens não globais
que apareceram. Imagens antigas
que trazem lembranças gostosas.
Mas quantas vezes a seqüência
em que Gabriela (Sônia Braga)
sobe no telhado de vestidinho de
algodão e de costas para a câmara
que olha de baixo já não foi repetida e repetida?
O programa é tímido. Além disso, omite conflitos e polêmicas
que afinal movem o dia-a-dia da
cultura. Sem a provocação constante que marcou a linha dramatúrgica da emissora e que, aliada
ao "padrão Globo de qualidade",
foi importante na consolidação
da TV brasileira, o programa reduz a história da TV a uma sequência morna de momentos felizes promovidos por uma emissora que fez questão de minimizar
seus méritos e realçar seu lado
conservador.
O documentário toca nos temas
e imagens que causaram polêmica sem enfrentar as questões cabeludas. Está lá o famigerado debate entre Lula e Collor, que, editado pelo "Jornal Nacional", foi
considerado como exemplo de
jornalismo viciado. A menção, seguida de imagens dos cara pintadas, não diz a que veio. Não há referência à celeuma que afinal é o
que justifica a inclusão do debate.
O documentário não faz jus à
grandeza da contribuição da TV à
história recente do país. Falta ousadia em enfrentar os paradoxos e
as perversidades gerados por um
meio de comunicação que rompe
com o monopólio que instituições tradicionais e hierárquicas
como a família, a escola e a igreja
detinham sobre a formação de
opinião, com uma linguagem
acessível a alfabetizados e iletrados em quase todo território nacional. Talvez se a memória da TV
não estivesse ela mesma sob um
quase monopólio, pudéssemos
desfrutar de histórias mais diversificadas.
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