São Paulo, sexta-feira, 17 de março de 2000


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TELEVISÃO
Série "50 Anos de TV" não faz jus à grandeza do veículo

ESTHER HAMBURGER
especial para Folha


Os documentários comemorativos dos 50 anos de TV anunciam a oportunidade rara, que se abre a cada 10 anos, de rever momentos da história da TV no Brasil. A Rede Globo deu a largada na última quarta-feira com o primeiro episódio de uma série de programas mensais. A produção da emissora é divertida, mas decepcionante. Mais uma vez fica evidente o descompasso entre o caráter público da concessão de canais e o caráter privado da manipulação de imagens que ao longo dos anos recheiam nosso cotidiano.
"A TV na Vida do Brasileiro" acertou ao marcar o início das comemorações com uma incursão no universo dos espectadores. O lugar do aparelho nas casas, a mediação que a TV realiza entre as gerações, a fascinação exercida por cada um dos gêneros televisivos, a dramaturgia, o esporte, os infantis, o jornalismo.
Uma garota expressa seu desejo de conhecer outras épocas pelas das novelas. Várias senhoras explicam sua vontade de ver histórias fantasiosas de amor. E uma sequência memorável de cenas de beijos através dos tempos marca a exibição cada vez mais liberal da sensualidade em imagens de felicidade romântica.
A escolha primorosa de cenas que marcaram época inspira uma vontade de ver mais. "A Praça da Alegria", Hebe Camargo, o "Jornal de Vanguarda" são alguns exemplos de imagens não globais que apareceram. Imagens antigas que trazem lembranças gostosas.
Mas quantas vezes a seqüência em que Gabriela (Sônia Braga) sobe no telhado de vestidinho de algodão e de costas para a câmara que olha de baixo já não foi repetida e repetida?
O programa é tímido. Além disso, omite conflitos e polêmicas que afinal movem o dia-a-dia da cultura. Sem a provocação constante que marcou a linha dramatúrgica da emissora e que, aliada ao "padrão Globo de qualidade", foi importante na consolidação da TV brasileira, o programa reduz a história da TV a uma sequência morna de momentos felizes promovidos por uma emissora que fez questão de minimizar seus méritos e realçar seu lado conservador.
O documentário toca nos temas e imagens que causaram polêmica sem enfrentar as questões cabeludas. Está lá o famigerado debate entre Lula e Collor, que, editado pelo "Jornal Nacional", foi considerado como exemplo de jornalismo viciado. A menção, seguida de imagens dos cara pintadas, não diz a que veio. Não há referência à celeuma que afinal é o que justifica a inclusão do debate.
O documentário não faz jus à grandeza da contribuição da TV à história recente do país. Falta ousadia em enfrentar os paradoxos e as perversidades gerados por um meio de comunicação que rompe com o monopólio que instituições tradicionais e hierárquicas como a família, a escola e a igreja detinham sobre a formação de opinião, com uma linguagem acessível a alfabetizados e iletrados em quase todo território nacional. Talvez se a memória da TV não estivesse ela mesma sob um quase monopólio, pudéssemos desfrutar de histórias mais diversificadas.


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