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Livro reúne ensaios sobre o desenho
Em "Disegno, Desenho, Desígnio", Edith Derdyk compilou 30 textos inéditos assinados por artistas
SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL
As 30 mil folhas de papel que
usou na instalação "Onda Seca", mostrada no ano passado
na Pinacoteca, e os mais de 60
km de linhas de algodão que
costurou no espaço ao longo da
carreira não deixam dúvida:
Edith Derdyk sente uma vontade imensa de desenhar.
Na multiplicação de linhas
que surge de um amontoado de
folhas e na escultura de traços
que levanta no espaço físico, a
artista vê no desenho algo além
do papel, que pode ser utilitário
e poético ao mesmo tempo.
É essa noção que serve de linha mestra para o livro que a
artista acaba de lançar, "Disegno, Desenho, Desígnio" (ed. Senac; 314 págs.; R$ 60), reunindo
30 ensaios de artistas plásticos,
arquitetos, curadores, músicos
e cientistas. Todos refletem, alguns com palavras, outros com
imagens, sobre o significado do
desenho em suas vidas.
Com exceção do texto do artista Waltercio Caldas, são todos inéditos, feitos a pedido de
Derdyk para o volume que sai
agora. Foram nove anos de correspondências trocadas com
seus convidados, até que uma
editora decidiu bancar o projeto. "O desafio foi como congregar essas vozes tão diferentes,
como compor uma polifonia
que não ficasse fechada em si
mesma", afirma Derdyk.
Do arroubo afetivo de Guto
Lacaz, que diz em seu texto que
o desenho foi seu "primeiro
amor", à análise pictórica de
vogais e consoantes do músico
Luiz Tatit, que descreve as letras como linhas que abrem e
fecham espaços sonoros, o livro
percorre um mapa do desenho.
Não à toa, como se percorrendo uma linha musical, Arnaldo Antunes aparece logo depois de Tatit, escrevendo à mão
garranchos espasmódicos
cheios de erros de ortografia seguidos da frase digitada: "A caligrafia está para a escrita como a
voz está para a fala".
Ritmo da imagem
Ao lado de um desenho seu,
nas primeiras páginas do livro,
Waltercio Caldas escreve um
texto breve, afirmando que
"quem desenha sabe o que esperar do traço: que cumpra o
seu papel e se desempenhe no
ritmo da imagem".
A idéia de que o desenho é
um traço dotado de potência física, como se servisse de guia
para estruturar o espaço físico,
esboço para um objeto real ou
escultura, é tema para vários
artistas, como Paulo Pasta e
Regina Silveira. Mas talvez o
contraponto mais tocante à
idéia fique por conta da conversa entre o artista Antonio Lizárraga e sua assistente, Maria
José Spiteri Tavolaro Passos.
Lizárraga, argentino radicado em São Paulo, sofreu um
derrame e ficou paralítico, podendo apenas falar. Privado da
habilidade de fazer desenhos,
passou a ditar poemas e instruções para seus assistentes, tendo de recorrer à palavra como
guia para composições visuais
-algumas delas podem ser vistas em mostra em cartaz em
São Paulo, no Estúdio Buck.
"Eu sempre fiquei muito intrigada com a maneira como
ele trabalha", diz Derdyk, que
incluiu no livro desenhos e poemas do artista. "É um inventário minucioso, contém o ato extenso do desenho, ou seja, ser
ele mesmo uma linguagem soberana e ser também um instrumento de conhecimento."
Assim o fotógrafo Gal Oppido
diz enxergar os traços rápidos
de seu pai, que pintava paisagens rurais a partir de pinceladas instantâneas, aproximando
o real de sua representação: "o
objeto e sua expressão materialmente próximos".
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