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TELEVISÃO
Série do GNT mistura depoimentos, entrevistas e encenações de passagens da vida do sociólogo Gilberto Freyre
"Casa Grande & Senzala" chega enfim à TV
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
O canal de TV paga GNT começa a exibir hoje a série documental "Casa Grande & Senzala", dirigida por Nelson Pereira
dos Santos. Dividida em quatro
episódios, a série se baseia no livro homônimo do sociólogo Gilberto Freyre, publicado em 1933 e
considerado um marco nos estudos sobre a formação do Brasil.
O primeiro episódio, que vai ao
ar hoje, ficou pronto antes dos outros e chegou a ser exibido pelo
GNT em abril do ano passado.
Sob o título "Gilberto Freyre, o
Cabral Moderno", retraça os passos do intelectual pernambucano,
buscando a gênese de sua obra
máxima.
É o segmento mais heterogêneo
da série. Mistura depoimentos de
arquivo do próprio Freyre com
explicações do narrador Edson
Nery da Fonseca, encenação de
passagens da vida do sociólogo e
entrevistas de alguns de seus descendentes, como Gilberto Freyre
Neto, superintendente da Fundação Gilberto Freyre.
Outro neto do escritor, Fernando de Mello Freyre, representa o
papel do jovem Gilberto Freyre na
reconstituição de algumas cenas
de sua vida.
O narrador Edson Nery da Fonseca -professor emérito da Universidade de Brasília e antigo amigo e colaborador de Freyre- vai
a Recife, Nova York e Coimbra,
mostrando os lugares onde o escritor viveu e estudou.
Inicialmente, Nelson Pereira
dos Santos havia pensado em chamar José Wilker para narrar a série. Ao entrevistar Edson Nery na
Fundação Gilberto Freyre, entretanto, percebeu que era ele a pessoa certa para a tarefa.
Nery acabou se tornando um
dos trunfos da série. Aos 79 anos,
ele mostra uma erudição e uma
verve admiráveis. Com a mesma
desenvoltura e a mesma graça, é
capaz de citar de memória uma
passagem de Varnhagen, declamar um poema de Manuel Bandeira ou cantar uma marchinha
de Carnaval.
Sua presença na série cresceu a
tal ponto que Nelson Pereira dos
Santos concedeu-lhe o crédito de
co-roteirista.
Os três povos
Cada um dos três episódios seguintes, todos inéditos, trata de
um dos três povos que deram origem ao brasileiro, segundo a análise de Gilberto Freyre: o índio, o
português e o africano.
Esses episódios são conduzidos
por Nery em companhia de alunas (interpretadas por atrizes).
No episódio referente aos índios, a pupila é uma negra. No dedicado aos portugueses, é uma índia. No segmento reservado aos
negros, é uma portuguesa.
Nelson Pereira lança mão de recursos variados de modo a tornar
a abordagem de Freyre mais próxima do espectador de hoje.
Um desses recursos são as viagens do narrador a locais que têm
relação com os temas do livro. No
episódio dedicado ao português,
por exemplo, Edson Nery visita
castelos mouros e antigas sinagogas em Portugal, enquanto fala
sobre a tradição de convivência
lusitana com outras culturas.
No segmento dedicado ao índio, por sua vez, o cineasta recorre
a preciosos trechos de velhos documentários, como os rodados
pelo major Reis nas expedições de
Rondon ou os filmados pelo sanitarista Noel Nutels.
Com exceção do primeiro segmento, mais biográfico, os outros
trazem trechos de uma adaptação
teatral de "Casa Grande & Senzala" montada pela Companhia de
Teatro Seraphim do Recife.
Mais interessantes do que tais
cenas -aliás, muito breves- são
os depoimentos dos atores que
participaram do projeto. Eles falam sobre o que o mergulho no
universo do livro lhes revelou sobre sua própria formação, seus
preconceitos, sua identidade cultural e étnica.
Orçamento reduzido
A idéia inicial de Nelson Pereira
era fazer uma série em 13 episódios, com orçamento de R$ 7 milhões. Como não conseguiu patrocínio, teve de redesenhar o
projeto em bases mais modestas:
quatro episódios de 52 minutos,
rodados em 16 milímetros, ao
custo de R$ 3 milhões.
Só conseguiu apoio do GNT e
da produtora Videofilmes. Para
viabilizar a série, usou recursos
que havia captado para a produção do longa-metragem "Guerra
e Liberdade - Castro Alves em São
Paulo", adiado indefinidamente.
O resultado do esforço é um trabalho admirável de tradução audiovisual de uma das obras fundamentais da nossa literatura.
Podem-se fazer dois reparos à
série: um por ter deixado de lado
as críticas feitas às interpretações
de Freyre em sua época e depois;
outro, por não deixar claro quando o narrador Edson Nery fala em
nome do autor e quando em seu
próprio nome.
CASA GRANDE & SENZALA - Série
inspirada na obra de Gilberto Freyre.
Direção: Nelson Pereira dos Santos. De
hoje a sexta-feira, às 22h30, no GNT.
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