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CINEMA/ESTRÉIA
"HOMEM-ARANHA"
Para Stan Lee, popularidade de herói se deve ao fato de ele enfrentar problemas do dia-a-dia dos fãs
Personagem tem males de mortais comuns
STAN LEE
ESPECIAL PARA O "NEW YORK TIMES"
O Homem-Aranha parece estar por toda parte hoje em
dia, e é assim que eu gosto que esteja. A versão para o cinema da
história em quadrinhos que criei
40 anos atrás, juntamente com o
artista Steve Ditko, estréia hoje, e
quase todo mundo com quem eu
esbarro me pergunta a mesma
coisa: por que "Spidey" continua
tão popular assim, mesmo depois
de todos estes anos?
Como meus próprios superpoderes não me permitem penetrar
nas mentes de seus fãs, posso apenas dar um palpite bem fundamentado.
Muitos leitores de longa data
me disseram que, de todos os personagens de quadrinhos já vistos,
o Homem-Aranha é o mais realista. É claro que falar em "fantasia
realista" é contraditório, mas
acho que entendo o que eles querem dizer. O alter ego de nosso
personagem principal, Peter Parker, talvez seja o único super-herói a ter problemas financeiros,
frustrações românticas e muitos
dos males que costumam acometer os comuns mortais. Já ocorreu
de ele sofrer um ataque alérgico
enquanto combatia os vilões da
história. Em lugar de viver numa
Metrópolis ou Gotham City mítica, ele habita a boa e velha Nova
York, e, quando se cansa de se dependurar de sua rede, pode ser
visto correndo atrás de um táxi
em qualquer lugar entre Greenwich Village e o Upper East Side.
Outra característica que diferencia o Homem-Aranha de seus
semelhantes é sua introspeção. O
pobre Spidey mal consegue dar
um passo sem questionar suas
próprias motivações e se indagar
se está fazendo a coisa certa. Na
verdade, "Homem-Aranha" foi a
primeira história em quadrinhos
a usar extensivamente os "balões
com pensamentos", com os quais
o leitor fica sabendo não apenas o
que um personagem está dizendo, mas também o que está pensando. Isso lhes permite realmente conhecer bem o personagem, e,
quanto mais você sabe sobre uma
pessoa, mais se interessa por ela.
Muitas vezes já passou por minha cabeça que o poder de atração que o Homem-Aranha exerce
em todo o mundo talvez se deva
em parte, também, a seu figurino.
Os fãs mais atentos já devem ter
observado que a roupa do Homem-Aranha recobre cada centímetro de seu corpo.
Quando Steve Ditko primeiramente visualizou a roupa de nosso herói, ele criou um dos modelos mais únicos na história dos
quadrinhos. Mais do que isso, porém, a roupa de Spidey é totalmente "a favor" do usuário. Qualquer leitor, de qualquer raça, em
qualquer parte do mundo, pode
se imaginar usando esse uniforme
e fantasiar que é o Homem-Aranha. Não estou certo de que tenhamos planejado que fosse assim, mas essa é uma daquelas felizes coincidências que fez de nosso
aventureiro de inspiração aracnídea possivelmente o mais empático herói a já ter agitado uma teia.
Outra qualidade que Spidey
possui em abundância é o senso
de humor. Não é de hoje que ele é
conhecido por seus comentários
espirituosos e seus chistes ágeis,
feitos no calor da batalha. O misto
aparentemente estranho de autocrítica contínua e diálogo irreverente ajuda a manter a atenção de
seus fãs grudada na aventura que
ele está vivendo no momento.
E, para concluir, não devemos
nos esquecer dos dilemas morais
que tão frequentemente surgem
na vida de Spidey. Não são poucas
as vezes em que ele não tem certeza total de estar fazendo a coisa
certa. Em lugar de enxergar tudo
em preto-e-branco, nós, da Marvel Comics, conscientemente
acrescentamos tonalidades de
cinza ao elenco de personagens.
Às vezes os vilões não são inteiramente maus e vice-versa. Espalhamos questões morais de modo a oferecer aos leitores a oportunidade de buscar suas respostas
próprias.
É assim que eu explicaria a popularidade de Spidey. Por outro
lado, é possível que tenhamos
simplesmente tido sorte, ao criarmos um herói de personalidade
simpática, um sujeito com quem
você curte passar algum tempo.
Tá vendo como pode ser fácil?
Stan Lee é co-criador de "Homem-Aranha"
Tradução Clara Allain
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