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CDS
POP
Discos da cantora carioca gravados nos anos 80 ganham remasterizações
Com relançamentos, Marina viaja de volta para o futuro
BRUNO YUTAKA SAITO
DA REPORTAGEM LOCAL
Mais do que artista solo, Marina
Lima é artista só. Cruzou por inteiro duas décadas de música,
criou caminhos, viu colegas desaparecerem e, agora, prestes a
completar 50 anos, volta ao ponto
inicial. A ocasião é propícia para a
revisão, já que a Universal recoloca no mercado a extensa obra da
cantora nos anos 80.
São oito CDs, vendidos separadamente, remasterizados com a
produção de Marcelo Fróes (responsável também pelos relançamentos de Roberto Carlos) e textos com comentários de Marina
sobre a história de cada disco. Segundo a Universal, a iniciativa pode ser a primeira de uma série
chamada "Coleção Anos 80", dedicada a relançar o catálogo completo de artistas do período. No
caso da cantora, a coleção preenche vácuos maiores -"Olhos Felizes" e "Certos Acordes" chegam
ao formato CD pela primeira vez.
Erra quem tenta enquadrá-la no
rol dos artistas que se refugiam no
passado (basta lembrar que seu
mais recente trabalho é o "Acústico MTV"). À Folha, Marina escolheu conceder entrevista por e-mail, e sua assessoria preferiu não
agendar fotos com a artista -ela
prepara um "espetáculo multimídia" dirigido por Monique Gardenberg, em que testará músicas
inéditas para um novo álbum.
"Quando lancei esses discos,
nos anos 80, falei longamente sobre eles. Agora, com esses relançamentos, falei horas sobre cada
um novamente. Sinceramente,
acho que, em relação a esse assunto, já dei o que tinha que dar",
afirma à Folha. "Não tenho todos
os discos, e fui dando e perdendo
alguns pelo caminho. Mas um dia
quero ter todos, para poder ver
bem como já trabalhei."
Os relançamentos colocam, indiretamente, duas épocas cruciais
para a cantora em confronto. Se,
naquele período, ela surgia no
mercado e construía uma sólida
carreira ("O duro era ser uma das
únicas mulheres com trabalho
autoral, isso era solitário"), hoje
ela tenta reconstruir sua trajetória, em um caminho não óbvio
para os artistas de sua geração
(como Lobão, por exemplo).
Está, portanto, tão só quanto era
em 1980, quando estreava na
Ariola com seu segundo disco,
"Olhos Felizes", e encarnava a figura da novata que desafiava o
reinado de cantoras de MPB estabelecidas. O embrião que iria
transformar a cultura jovem e o
rock em fenômeno de massa no
Brasil ainda era apenas idealizado. Marina começou a visualizar
com mais clareza a conexão com
esse público em "... Desta Vida
Desta Arte" (1982), e definitivamente no bem vendido "Fullgás"
(1984) -que o encarte informa
erroneamente ser de 1988. A ponte entre os anos 70 e os 80 estava
feita, e atravessada, portanto.
Continuaria em empreitada solitária. Enquanto bandas surgiam,
Marina seguia solo, entre o pop, o
rock e a MPB. Nos anos 90, o sucesso de nomes como Cássia
Eller, Marisa Monte ou Adriana
Calcanhotto mostrava que as coisas mudavam, tanto musicalmente quanto sexualmente.
Ela sente-se responsável por esse cenário? "Bem, cheguei com
uma sonoridade diferente, querendo abrir novas fronteiras na
música brasileira. E as canções
eram muito boas. Se vejo conexões? Aqui e ali... Hoje existem
muito mais cantoras e compositoras do que nos 80. E o que mais
valorizo é uma busca pela depuração. Esse é o elo que desejo ter
com quem está chegando", diz.
Outra ponte, e outra década
(anos 90), atravessada por Marina. Se ela acha que falta reconhecimento, hoje, ao seu trabalho,
devido ao fato de ser mulher?
"Se eu fosse homem, a minha
trajetória seria outra. Mas acho
que as pessoas sabem, sim, o valor
do meu trabalho. O que não
adianta é esperar que elas fiquem
elogiando ou babando demais o
ovo... Isso não rola mesmo, até
pelo fato de eu ser mulher [risos].
Só se eu fizesse muito lobby."
Enquanto não ganha novo rótulo (já foi a "gata romântica", no
começo dos 80, e "jovem senhora", nos 90), Marina ensaia a
construção de nova ponte, esta
talvez a mais sofrida de todas, em
direção aos anos 2000. Parcerias e
público à parte, ela sempre soube
se virar muito bem sozinha.
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