São Paulo, quinta-feira, 17 de junho de 2010

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CRÍTICA DRAMA

Violência crua marca filme genial

Um dos melhores longas do ano, "O Profeta" dá fôlego ao gênero com roteiro rico e amarrado


O TIROTEIO, NO MEIO DA RUA, É DAS SEQUÊNCIAS MAIS ESPETACULARES E ASSUSTADORAS DO CINEMA NOS ÚLTIMOS ANOS


ANDRÉ BARCINSKI
CRÍTICO DA FOLHA

Se nenhuma grande surpresa ocorrer nos próximos seis meses, o melhor filme do ano estreia amanhã: "O Profeta", de Jacques Audiard.
É uma dessas ocasiões, cada vez mais raras, em que se sai do cinema com um impulso irresistível de voltar à sala e ver o filme novamente, só para relembrar sequências particularmente geniais.
"O Profeta" conta a história de Malik El Djebena (Tahar Rahim), um jovem criminoso árabe que chega a uma prisão francesa. Malik é analfabeto e assustado. Anda pelos corredores de cabeça baixa, olhando para os lados como se esperasse ser esfaqueado a qualquer hora. Mas logo vai se acostumar.
A "educação" criminal de Malik é o mote de "O Profeta": como a prisão transforma jovens fracos em Corleones. O tema já foi explorado diversas vezes, mas nunca com tanto talento.
"O Profeta" não é só um grande filme de gângster, com algumas das cenas mais inventivas e tensas do gênero, mas também um relato cirúrgico das maquinações e da política interna dos presídios, de como os preconceitos sociais e raciais se manifestam também dentro de seus muros.

PÁRIA
Pouco tempo depois de chegar à cadeia, Malik tem um encontro com Cesar Luciani (o ótimo Niels Arestrup), um temido chefão córsico que, embora preso, controla todo o local.
A oferta de Niels é simples: ou ele mata um informante árabe, ou morre. É o primeiro assassinato de Malik e vai assombrá-lo para sempre.
Dali em diante, Malik vira um pária: a gangue córsica o renega por ser árabe, os presos árabes o renegam por sua ligação com os córsicos. Escorraçado por todos, o jovem aprende a sobreviver.
Luciani manda Malik em missões fora da cadeia, aproveitando as folgas por bom comportamento do jovem.
Essas missões incluem pagar o resgate de um bandido córsico, negociar um trato com um mafioso rival e assassinar um gângster em Paris. O tiroteio, no meio da rua, é uma das sequências mais espetaculares e assustadoras do cinema nos últimos anos.
"O Profeta" tem qualidades que faltam à maioria dos filmes do gênero: os personagens secundários são complexos e interessantes, não apenas alvos de tiros; o roteiro é bem escrito e consegue ser claro sem ser didático.
A história dá mil voltas, mas tudo é bem amarrado e o espectador pode acompanhar com clareza todas as subtramas.
O filme não tenta explicar nada. Não há grandes tratados sociológicos ou análises; as coisas são o que são.
A violência em "O Profeta" não é estilizada ou glorificada, mas exposta de uma forma crua que a torna ainda mais impactante.
O assassinato do informante árabe, em especial, é prova disso: Malik é novato no crime e a maneira atrapalhada e nervosa com que comete o assassinato multiplica a tensão. O ator Tahar Rahim, um jovem francês de origem argelina, consegue dar a Malik um misto de fragilidade e violência que faz o personagem ainda mais marcante e surpreendente. Enfim, "O Profeta" é um desses filmes que renovam a fé no cinema e dão gás a um gênero que anda afogado em clichês e fórmulas. Imperdível.


O PROFETA

DIREÇÃO Jacques Audiard
PRODUÇÃO França/Itália, 2009
COM Tahar Rahim, Niels Arestrup
CLASSIFICAÇÃO não informada
AVALIAÇÃO ótimo



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