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MÚSICA
Em entrevista por e-mail, cantora diz desejar "passar cetro e coroa" às sucessoras
Semi-reclusa, Rita Lee quer fazer disco new age
Marcelo Min/Folha Imagem
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A cantora e compositora Rita Lee, ex-Mutantes e ex-Tutti Frutti, que lança o disco "3001", com elementos de música tecno |
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL
Aos 33 anos de carreira "bossa'n'roll", Rita Lee anda eletrônica
e virtual. Semi-reclusa, divulga
seu novo CD, o retrofuturista
"3001", na TV, mas prefere fugir
do assédio explícito da imprensa.
Assim, a ex-mocinha dos Mutantes, ex-mulher de frente do
Tutti Frutti e ex-rainha pop na
parceria com Roberto de Carvalho escreveu à Folha sobre o status atual, de "roqueira-tecneira"
madura, mas só por e-mail.
Recusou o contato cara a cara,
mas aceitou diversas rodadas de
perguntas e respostas, disparadas
antes e depois de ir ao programa
de Jô Soares na Globo, antes e depois de ler a crítica publicada
quarta-feira na Folha. Leia trechos a seguir.
Folha - Por que o disco abre com a
nova "3001" e a regravação de
"2001", nesta sequência?
Rita Lee - Fez o maior sentido,
tanto conceitual quanto numérico, estarem nessa sequência. São
as duas únicas faixas com a utilização das "eletronicidades" modernas, das quais também sou fã.
Folha - Você pode falar sobre esse
sentido conceitual?
Rita - É um calendário invertido.
Em "3001", a raça humana não
apresenta sinais da existência de
ego subjetivo, tamanho é o envolvimento da ciência sagrada em
preservar a vida da Terra. Algum
controle é disparado, e o tempo
regride até "2001". Lá se verifica
como o astronauta libertado
-um Homo sapiens distanciado
do homem-sapo, um terráqueo
distanciado do batráquio- resolvia a difícil parada de sua geração.
Foi muito inspirador perceber como a raça humana conseguiu,
apesar de tudo, dar certo. Nada
como um milênio após o outro.
Folha - Esse papo é um pouco maluco, não?
Rita - Diga isso para Tom Zé, ele
vai dizer que maluco é você.
Folha - Você prefere que se lembrem da versão dos Mutantes de
"2001" (69) e a comparem com a
nova ou que a ouçam como se fosse
uma música inédita?
Rita - Você insiste nesse nhenhenhém de que me recuso a aceitar a
importância histórica dos Mutantes, eta falta de assunto. A versão
antiga de "2001", apesar de genial,
fazia as pessoas derraparem
quando mudava o "caipirês" do
refrão para o espacial da segunda
parte. Na versão dos Mutantes,
peguei a letra de Tom Zé e coloquei meu herói Jeca Tatu como
personagem. Hoje, com essa estética violenta de rodeios, meu Jeca
pacifista virou torturador de animais e não merece ser mencionado. Mas quem gosta de fazer comparações é perua em dia de festa.
Folha - Por que você está aderindo à linguagem eletrônica agora? É
natural ou oportunista, uma necessidade estética ou de mercado?
Rita - Sempre fui pioneira em
utilizar instrumentos eletrônicos,
como foi com Theremin, Minimoog, Mellotron, bateria eletrônica Roland e outros. O bacana é que tirei uma porrada desses instrumentos antigões do meu baú de
33 anos de estrada ainda preservados em tonéis de carvalho.
E, por favor, não confunda necessidade com vontade. Já não tenho necessidade de porra nenhuma nessas alturas da vida.
Folha - Vários artistas de sua gravadora têm relido sucessos bregas
depois do estouro de "Sozinho", de
Peninha, com Caetano Veloso. É a
tentativa de perseguir uma fórmula de sucesso comercial?
Rita - Porra, sr. PAS, isso é jeito
de se referir a uma música que regravei em sua homenagem? Sem
querer defender minha gravadora, mas defendendo por questão
de justiça, Kid Abelha, Ira! e Titãs,
que fizeram discos com releituras
do começo ao fim, eram de outra
gravadora, ou estou enganada?
Sou apaixonada por "Erva Venenosa" desde quando lia gibis do
"Batman" ouvindo "Poison Ivy",
com The Coasters, em 57, antes
das fórmulas de sucesso comercial existirem. "Erva Venenosa"
sempre foi bacanuda, desde "Bossa'n Roll" tenho ela na cabeça.
Folha - É um problema para um
artista com a sua idade e a sua bagagem se posicionar diante da
atual indústria fonográfica, que
privilegia os hits instantâneos e as
músicas de bunda?
Rita - Pois é, há mais oportunismo nisso, por exemplo, do que eu
me deixar influenciar por música
eletrônica. Com relação a meus 52
anos de idade, posso dizer que,
além de sobriedade, ganho cada
vez mais respeito e liberdade para
fazer o que quero e bem entendo.
Não vejo necessidade de me posicionar diante de porra nenhuma
de indústria fonográfica que privilegia música de bunda. Minha
bagagem privilegia outros atributos que não os "bundais".
Folha - Como foi dividida a parceria com Zélia Duncan em "Pagu"?
Rita - Vocês publicaram um pedaço errado da letra de "Pagu". O
certo é "meu peito NÃO é de silicone", e não "meu peito é de silicone". Certa vez, Zélia e eu entramos num papo "femealista" e notamos que há um desequilíbrio
entre o talento rebolante e o talento pensante das mulheres brasileiras. Depois desse papinho, fiquei
inspirada a escrever uma letra,
continuando a série mulheres no
"phoder". Mandei a letra, ela
mandou um blues genial de volta.
Resolvi mexer na letra cortando
as gordurinhas femininas, mas a
música sofreu pequenas mudanças. No fim tudo deu certo, Zélia e
eu vivemos felizes para sempre.
Folha - As participações de Zélia e
Fernanda Takai são uma forma de
você apadrinhar novas "ritas lee"?
Rita - Elas representam o sanguinho novo feminino com certificado de qualidade. Torço para
que, antes de ir para o "túmbalo", eu possa passar elegantemente cetro e coroa para as mãos de minhas queridas sucessoras.
Folha - Depois de "O Amor aos Pedaços", bem chanchadesca, vem a
séria "Cobra". Assim como rock e
tecno, são extremos conciliáveis?
Rita - Ué, na sua crítica entendi
que "Amor em Pedaços" era o mimo do disco, agora diz que é
chanchadesca? É uma balada "jovem-guardesca", Fernandinha e
eu levamos a sério nosso dueto de
Wanderléa e Martinha. Não se
trata de uma chanchada tolinha, é
uma homenagem ao estilo ginasiano da época, mas com mais sofisticação na indumentária instrumental. Não se trata de uma
música "calça boca de sino", está
mais pra terninho Beatles. Na sequência vem "Cobra", que é o
avesso -densa, misteriosa, cheia
de refúgios sutis, o bicho peçonhento num momento de pura
entrega emocional.
Folha - Os Mutantes reconheciam
a jovem guarda, mas não deixavam
de ironizá-la. Ainda existe essa instância da ironia?
Rita - A gente meio que ironizava porque a estética e o discurso
musical do tropicalismo diferiam
bastante dos da jovem guarda.
Hoje, com o distanciamento do
tempo, percebo que ambos os
movimentos foram do cacete.
Mas, ainda assim, o visual tropicalista dava um pau no deles.
Folha - O que você ainda sonha
fazer no estúdio e ainda não fez?
Rita - Estou pensando em gravar
um disco... Bem, errr... Está bem,
vai, estou louca pra gravar um
disco new age!
Folha - Como seria isso?
Rita - Hahá, mistério sempre há
de pintar por aí...
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