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ERUDITO
Alicia de Larrocha se apresenta hoje no Festival de Inverno de
Campos de Jordão
Pianista "reserva' é melhor que titular
IRINEU FRANCO PERPETUO
especial para a Folha
Uma substituta é a atração mais
sofisticada do 29º Festival de Inverno de Campos do Jordão. Graças ao cancelamento da turnê brasileira do pianista russo Evgueni
Kíssin, 27, a grande dama espanhola do piano, Alicia de Larrocha
y de la Calle, 75, tocará no festival.
Elegante em Mozart, apaixonada em Schumann e idiomática nos
compositores espanhóis, Alicia de
Larrocha é uma aristocrata do teclado que deu seu primeiro concerto aos cinco anos de idade e
imortalizou seu nome em uma série de gravações notáveis, vencedoras de vários Grammy.
Foi parceira de música de câmera de astros como Gaspar Cassadó
(violoncelo), Montserrat Caballé e
Victoria de Los Angeles (sopranos) e dos quartetos de cordas
Guarneri e Emerson.
No Brasil, seu recital será dedicado a Schumann e dois autores
de seu país: Albéniz e Turina.
Alicia de Larrocha falou com exclusividade à Folha, por telefone,
do Rio de Janeiro, onde começou
sua turnê brasileira.
Folha - De Schumann, a sra. deveria interpretar a "Fantasia op.
17", mas acabou trocando-a por
"Carnaval op. 9". Por quê?
Alicia de Larrocha y de la Calle -
Queriam que eu tocasse a "Fantasia op. 17", mas é uma obra muito
difícil para pianista e público. Se
não for um público muito musical,
é uma obra muito dura de entender. Então, propus a troca por
"Carnaval".
Folha - A sra. está sempre divulgando os autores espanhóis.
Alicia - Sempre não, só quando
me pedem (risos).
Folha - Para a sra., há características especiais da música espanhola para o teclado?
Alicia - Temos quatro grande
compositores -poucos, mas geniais. Granados é o compositor romântico; depois, temos Albeniz,
que, quando vivia em Paris, foi influenciado pelo Impressionismo;
temos Falla, que é puro "cante
jondo" -o que não é o mesmo
que flamenco- e, ainda, Turina,
que é o típico sevilhano. Mas os
quatro são muito distintos entre si.
Folha - Como é sua relação com
Schumann?
Alicia - Toco sua música desde
jovem e tenho muita afinidade,
pois ele era geminiano, como eu.
Folha - O que há de geminiano
na música de Schumann?
Alicia - A fantasia, o gênio...
coisas que os outros não têm.
Folha - A sra. tem planos de gravação?
Alicia - Não, porque há quatro
discos meus já gravados que ainda
não saíram.
Folha - Todos pela BMG?
Alicia - Sim, a gravadora está
em uma crise tremenda e não produz nem lança nada. Ou melhor:
só lança aquilo que eles acham que
vai dar dinheiro, o mais comercial.
Folha - A crise não é de todo o
mercado?
Alicia - Sim, mas a BMG está
pior do que as outras.
Folha - Ainda restam coisas no
repertório que a sra. gostaria de
fazer e não fez?
Alicia - Muitíssimas, mas, agora, é tarde demais. Só posso vir a
fazer coisas novas de compositores que conheço muito bem, como
Beethoven, Schumann e outros
autores que já toco.
Folha - A sra. sabe que foi chamada para substituir o russo Evgueni Kíssin. Qual sua opinião a
respeito dele?
Alicia - Um gênio. Um verdadeiro fenômeno. Ele é fora do normal. Como dizem os americanos,
"out of this world".
Folha - Apesar de ter começado
a tocar piano muito cedo, a sra.
nunca se considerou uma criança-prodígio?
Alicia - Eu não comecei nunca,
porque já nasci em casa de músicos, e, desde bebê, o piano era
meu brinquedo.
Folha - A sra. aprendeu primeiro
a ler as notas ou o alfabeto.?
Alicia - As notas. Meu brinquedo era o piano. Até que, um dia, eu
estropiei tanto o piano, tirando
suas teclas para pintar, que minhas tias o trancaram com chave.
Daí foi realmente meu começo. Fiquei tão desesperada que batia a
cabeça no chão, saindo sangue.
Depois de tanto drama, resolveram me devolver o piano. Talvez
esse tenha sido o meu começo de
verdade.
Concerto: Alicia de Larrocha y de la Calle
(piano)
Onde: auditório Cláudio Santoro (av. Dr.
Arrobas Martins, 1.880, tel. 012/262-2334,
Campos do Jordão)
Quando: hoje, às 21h
Quanto: R$ 10
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