São Paulo, quarta-feira, 17 de agosto de 2005

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LITERATURA

Escritores apresentam shows poéticos no evento "Outros Bárbaros", que ocorre no Itaú Cultural de hoje a sábado

Poetas ultrapassam fronteira do território da música

JULIÁN FUKS
DA REPORTAGEM LOCAL

Ritmos entoados, rimas toando, assonâncias acentuando-se, aliterações alternando. Toda a velha arte da melopéia será agora apenas parte. De hoje a sábado, no evento "Outros Bárbaros", do Itaú Cultural, a poesia se aliará indissoluvelmente a uma de suas tantas artes irmãs, talvez aquela cujos traços mais se confundem com os dela: a música.
Difícil é definir os termos dessa aliança. Não se trata de poesia musicada, ou de leitura de poemas acompanhada por arranjos sonoros, segundo explica Ademir Assunção, organizador do evento e um de seus protagonistas. Serão oito "shows poéticos", de oito poetas distintos, que entoarão suas obras ao som de instrumentos variados, modificando-os e sendo modificados por eles. "A intenção é transitar por essa fronteira indefinível que existe entre a música e a poesia", diz Assunção.
A cada noite, dois poetas terão total liberdade inventiva para performar tudo o que tiverem combinado -e também o que lhes calhar improvisar- com os guitarristas, violonistas, tecladistas, DJs e percussionistas que os acompanharem. Cada show terá cerca de 40 minutos.
Hoje, dão início ao evento os poetas Celso Borges e Frederico Barbosa. Amanhã, farão seus shows Artur Gomes e Rodrigo Garcia Lopes. Na sexta, Marcelo Montenegro e Chacal. Por fim, no sábado, Ricardo Aleixo e o próprio Ademir Assunção, que aproveita a ocasião para lançar seu CD "Rebelião na Zona Fantasma", que guarda os princípios do evento e inclui parcerias com Zeca Baleiro e Edvaldo Santana.
"É a retomada da tradição poética oral, muito anterior a qualquer livro", diz Assunção, que verifica em parte do cenário da poesia brasileira um movimento nessa direção. Segundo ele, os poetas convidados são apenas uma pequena amostra do que se vem fazendo nesse campo quase híbrido de interação com a música.
Todos eles, de fato, vêm fazendo trabalhos na área já há um certo tempo, alguns inclusive com CDs lançados, como Artur Gomes e Rodrigo Garcia Lopes. Chacal também é exemplo dessa antigüidade. Há 30 anos, começou recitando poesia, e sua obra herdou traços dessa oralidade e compreensão fácil aos ouvidos. O que ele exalta, entretanto, é "o contato direto que essas coisas proporcionam, que permite a reprodução dos silêncios, da respiração".
No título do evento reside mais um de seus princípios. Assunção toma a palavra para justificar a escolha, mas ressalva que, mesmo entre os demais participantes, há discordâncias. "Ultimamente, a poesia anda muito comportada, professoral. A idéia é trazer a ela selvageria, posicionamento", diz.
Em um dos belos poemas que entoa em seu CD, que, além de música e poesia, alia lirismo e brutalidade, a posição ganha ritmo e o otimismo de remeter a realidade ao passado: "Houve um tempo torto/ um certo tempo atrás/ letras sílabas palavras/ não explodiam mais/ não explodiam mais nada". Em outro, mais forte e áspero, define um possível papel do poeta já no título, "O Coisa Ruim", e conclui com "eu sou o que sangra/ um poeta nato".
Chacal é didático para dar palavras finais às idéias que eles tentam recuperar: "A sujeira inerente a tudo o que vive, a tudo o que respira, foi deixada de lado. É hora de recuperar a simbiose entre a poesia e a vida".


Outros Bárbaros
Onde:
Itaú Cultural (av. Paulista, 149, SP, tel. 0/xx/11/2168-1776)
Quando: de hoje a sáb., às 19h30
Quanto: entrada franca (retirar ingressos meia hora antes)


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