São Paulo, sexta-feira, 17 de agosto de 2007

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TV por você

Televisão pega carona na internet 2.0 e elabora programas com conteúdo produzido pelos próprios espectadores

Em tempo de TVs de plasma, canais buscam produções gravadas por câmeras caseiras, celular e webcam para tentar atrair o público

LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Em tempos de telas de plasma e transmissão em alta definição, vejam só, a televisão corre atrás de programas com imagem e som de baixa qualidade.
Esse é o preço de tentar conquistar uma geração cada vez mais ligada nos vídeos da internet e à comunicação por celular do que nas caretices da programação da TV convencional.
De carona na web 2.0, como ficou conhecida a internet com conteúdo criado pelos internautas (a exemplo do site YouTube), a televisão ensaia o que se poderia batizar de TV 2.0.
Internet e celular não são mais apenas ferramentas de apoio a formatos tradicionais, como é o caso da votação do "Big Brother". Vemos agora iniciativas nas quais a própria tecnologia dita o conceito dos programas, e telespectadores produzem -ou ao menos ajudam a elaborar- o que vai ao ar na TV.
O Multishow estréia em setembro os programas "Retrato Celular", só com cenas gravadas por celulares distribuídos a jovens e "11 Câmeras", que foca relacionamentos a partir de webcams.
Há duas semanas, o canal colocou no ar "Urbano", que transmite um bate-papo realizado pela internet e também gravado por pequenas câmeras acopladas ao computador.
Além disso, está no ar há 15 dias o Fiz TV, canal da Abril que passa o dia veiculando vídeos produzidos pelo público e colocados no www.fiztv.com.br.
Novos canais a serem lançado pela Abril também contarão com programas da TV 2.0, de acordo com André Mantovani (ex-MTV), responsável pelos projetos televisivos do grupo.
"A grande novidade que essas iniciativas trazem à TV é a riqueza do conteúdo. Não técnico, mas do ponto de vista dos roteiros. Você assiste a um vídeo produzido pelo telespectador e não consegue prever o final. A TV convencional, assim como o cinema de Hollywood, é muito previsível", opina.
Ele cita como destaque "Não Perca a Cabeça", de alunos da Escola de Comunicações e Artes da USP. A atriz Bárbara Paz (SBT) é uma garota que veste uma camiseta escrita "gostosa" e sofre insólita tentativa de estupro. Outro é "Conversas de Elevador", série que já tem mais de 20 episódios. O criador, Felipe Reis, aproveita as madrugadas para filmar em seu prédio. Seu personagem passa por várias situações no elevador, de cantadas frustradas a uma briga com um anão, que o rapaz, distraído com o iPod em alto volume, acaba espremendo contra a parede.
"É claro que nunca haverá produção caseira como "Lost", e por isso a TV convencional não deve desaparecer. Mas hoje não há por que não aproveitar o conteúdo feito pelo público, que surgiu com o barateamento dos equipamentos."
Para Christian Machado, gerente de produção do Multishow, a qualidade da imagem e do som pode ficar em segundo plano quando o foco é o conteúdo. "Os celulares com câmeras e as webcams permitem uma intimidade com os personagens que jamais teríamos se isso fosse captado por uma equipe de televisão carregando todos os equipamentos", diz.
Segundo ele, o objetivo da opção do Multishow pela TV 2.0 é gerar identificação com o telespectador, especialmente porque o canal é voltado a jovens. "Apesar de a TV continuar presa à grade de programação, essa é uma maneira de nos aproximarmos de uma geração que consome internet."
A grade horária de programação e o fato de um produtor selecionar os vídeos do público que vão ao ar tornam a TV 2.0 um "subproduto" da web 2.0, na opinião de Renata Gomes, professora do curso "Criação de Imagem e Sons em Meios Eletrônicos", da pós-graduação do Senac de São Paulo.
"A TV convencional tende a olhar para a produção da web 2.0. O sucesso estrondoso do YouTube está modificando a maneira como as pessoas vêem TV. Essas iniciativas são interessantes, mas é bom lembrar que, por ora, a TV ainda tem filtros", afirma Renata, lembrando, por exemplo, a inexistência de ferramentas como o "video on demand" (o espectador acessa o programa por um menu quando quiser), que devem chegar com a TV digital.
"Além disso, é importante que os canais não façam esse tipo de programa apenas porque é "modinha", mas que essa produção colaborativa realmente traga discursos que hoje não conseguem entrar na TV."


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