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A saga patética de Patópolis
Em novo livro, Marcelo Coelho usa o universo da Disney para satirizar mitos culturais, religiosos e políticos
ALCINO LEITE NETO
EDITOR DA PUBLIFOLHA
O escritor e jornalista Marcelo Coelho é um intelectual
de fina erudição. Quem
acompanha as suas colunas
na Folha sabe com que desenvoltura e rigor ele passa
da poesia de Valéry à música
de Schoenberg, do pensamento de Adorno à literatura
de Proust.
Que leitor, entretanto,
imaginaria que Coelho é também um cultíssimo "connaisseur" dos quadrinhos de Pato Donald e Tio Patinhas? E que um dia mergulharia de
cabeça na mitologia de Disney para tirar daí a substância de um livro inteiro, "Patópolis", que é lançado hoje?
O título é tão perverso
quanto o conteúdo. Atenção!
Esta não é uma obra para
crianças!
É uma metralhadora giratória, que quer abater, com
feroz compulsão satírica, tudo o que vê pela frente: a própria afetação erudita, os mitos culturais e políticos, o
cristianismo, a publicidade,
a mesquinhez da vida brasileira e, sobretudo, o persistente infantilismo de todos
nós -inclusive do autor.
"A única coisa levada a sério é o Pato Donald. Parafraseando Karl Marx, é como se
a história se repetisse não como farsa, mas como história
em quadrinhos", afirma Coelho, que é membro do Conselho Editorial da Folha.
O livro vai mais longe ainda em seu pessimismo e sua
ironia. É como se não apenas
a vida social tivesse sido
"achatada" até o nível dos gibis, mas a realidade, ela mesma, não passasse de uma representação bidimensional.
"É uma alucinação psicológica que me ocorre há
anos, espero livrar-me dela
depois deste livro", diz.
HUMOR DELIRANTE
Obra inclassificável, entre
ensaio, ficção e memória,
"Patópolis" é um arriscado
experimento literário, que
não respeita regras, cânones
e nem mesmo o leitor, cuja
seriedade é desafiada o tempo todo pelo humor delirante
do autor.
O livro se constrói por
meio de uma espécie de escrita automática, que vai liberando um enxame de reflexões, associações de ideias e
citações.
A unidade do conjunto é
garantida pela firmeza intelectual do projeto -e o resultado é um "divertimento"
cruel até não poder mais.
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