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São Paulo, sexta-feira, 17 de outubro de 2003

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27° MOSTRA INTERNACIONAL DE CINEMA DE SP

Em "Elephant", que tem como cenário o massacre de Columbine, diretor privilegia a figura do adolescente sem defender teses

Van Sant choca através da simplicidade

PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA

Gus van Sant filma jovens como nenhum outro cineasta contemporâneo. Lança em direção a eles um olhar curioso, erotizado, que potencializa a imagem do mais banal de seus filmes ("Gênio Indomável", para citar um exemplo).
Em "Elefante", Palma de Ouro e prêmio de melhor direção no Festival de Cannes, o diretor vai longe nessa proposta. Mais solto na composição do quadro, mais livre na direção dos atores (pela primeira vez, não-profissionais), ele fez um filme de pura observação sem ser, necessariamente, um filme de voyeur.
A referência silenciosa, porém evidente, é o massacre ocorrido na escola de Columbine, aquele em que dois adolescentes mataram 13 e feriram dezenas de estudantes e professores da escola onde estudavam, antes de decidirem se suicidar.
O título é uma homenagem a um filme homônimo, muito pouco conhecido, do diretor inglês Alan Clarke, que aborda a violência na Irlanda do Norte e particularmente o envolvimento dos jovens com o IRA (Exército Republicano Irlandês).
Para Clarke, a questão da violência juvenil é do tamanho de um elefante na sala de estar mas, ainda assim, todos parecem se recusar a enxergá-la.
O tratamento de Van Sant a tema tão complexo é despojado, numa aparente recusa de intelectualização do episódio. O que realmente lhe interessa é o adolescente, o espaço físico que o cerca (no caso, a cidade de Portland, onde ele realizou praticamente todos os seus filmes) e seu cotidiano: aula, dever de casa, esportes, hobbies, fofoca, etc.
A partir daí, o diretor constrói longos planos-seqüências que acompanham os personagens de perto, um a um, pelos gramados onde se joga futebol, os longos corredores que levam às salas de aula, o refeitório limpo e impecável, as paredes de vidro que dão estranha "transparência" a certos cantos da escola. Quando for necessário, ele voltará no tempo para mostrar como e quando esses personagens se cruzaram nesse dia de desfecho trágico.
"Elefante" não é, de forma alguma, um filme de tese como era, por exemplo, o documentário superexplicativo "Tiros em Columbine". Mais parece um filme "geográfico", em que o enquadramento muitas vezes é estranho, e o enfoque, aparentemente banal. Mas é justamente essa "simplicidade" que faz a grandeza do filme. Quando a violência entra em cena, tratada de forma absolutamente anti-espetacular, ela se torna impressionante em sua banalidade. Não há espaço para a emoção lacrimosa, só para o choque.


Elefante
Elephant
     Direção: Gus van Sant Produção: EUA, 2003 Com: Alex Frost, Eric Deulen e John Robinson Quando: hoje, às 23h10, no Unibanco Arteplex, amanhã às 14h30, no Cinearte 1, dom. às 19h, no Villa-Lobos 2, e dia 24, às 21h30, no Cine Morumbi 3.


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