São Paulo, domingo, 17 de outubro de 2004

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ARTES CÊNICAS

Ingressos sobem em média 16% em quatro capitais, segundo IBGE

Teatro ensaia crise com alta de preços e queda de público

SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

E PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

"Eles deveriam pedir para a gente pagar na saída", foi a conclusão da designer Renata Galvão, 25, ao experimentar o sistema de "pague quanto der", em vigor no Teatro de Arena, em São Paulo, com o espetáculo "Arena Conta Danton".
Na bilheteria, um texto da Cia Livre, responsável pela peça, esclarece que o valor que o espectador decidir desembolsar "é ingresso, não é contribuição". A decisão de deixar a platéia definir quanto pagar vem da convicção da companhia de que "há um público que quer ir ao teatro, mas não vai por causa do valor do ingresso", como afirma a diretora da peça, Cibele Forjaz.
A designer, que preferiria resolver na saída quanto vale(u) o show, apostou R$ 3 no espetáculo. "Daria mais. Mas estou lisa."
Entre o sistema "pague quanto der" de "Arena Conta Danton" e os R$ 135 cobrados por um bom lugar na platéia de "Chicago", o paulistano paga em média R$ 16 para ir ao teatro. O cálculo é de Carlos Meceni, presidente da Apetesp (Associação de Produtores de Espetáculos Teatrais do Estado de São Paulo).
Em outra medição estatística do mercado de teatro, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) identificou aumento médio de 16% nos preços de ingressos neste ano, subida que ultrapassa com folga a variação do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) no mesmo período (janeiro a setembro) -5,49%.
São Paulo, porém, fica fora dessa conta, porque o IBGE realiza o cálculo apenas nas capitais em que o gasto com entradas de teatro tem peso significativo no orçamento das famílias. São elas: Rio de Janeiro, onde o aumento foi de 15,99%, Recife (16,68%), Curitiba (20,95%) e Goiânia (3,05%).
Mas, pela matemática de Meceni, há algo errado também no reino do teatro paulista. "São Paulo tem uma oferta de 35 mil assentos/dia. A média de desocupação é de 60%", diz o produtor, que aponta o desafio: "A conta que se tinha de fazer é como colocar esses 60% para dentro do teatro".
O produtor Nilson Raman, que atua no Rio de Janeiro, diz que "abrir a cortina, hoje, é muito caro, principalmente pelo valor de aluguel de som e luz". O nó se fecha, segundo Raman, com a impossibilidade de repassar aos ingressos os custos de produção.
"Em 1991, quando viajei com "Bibi in Concert", o ingresso custava [o equivalente a] US$ 25 [R$ 70, valor atual]. Hoje, não consigo passar dos R$ 40, porque o público não vai pagar."
Nem sempre o público está indisposto a encarar ingressos altos. Segundo Meceni, os espetáculos que detêm melhor média de ocupação em São Paulo são os que cobram os ingressos mais altos. Uma explicação para o fenômeno é que esse perfil de espetáculo conta com nomes famosos no elenco, chamariz infalível para platéias de alto poder aquisitivo.
É o que ajuda a explicar, por exemplo, o sucesso de "Chicago", que encontra espectadores dispostos a desembolsar até R$ 135 para ver Danielle Winits desempenhando como a personagem Velma Kelly.
"Chicago" é produzido pela filial brasileira da espanhola CIE, que se especializou na franquia de musicais da Broadway. A CIE já montou aqui "A Bela e a Fera" (ingressos de R$ 40 a R$ 150), "Les Misérables" (R$ 30 a R$ 100) e prepara "O Fantasma da Ópera".
A reportagem tentou ouvir o executivo da CIE Fernando Alterio sobre o mercado de teatro no Brasil. Sua assessoria informou que ele não daria entrevista, porque tinha viagem marcada para a Espanha, além de uma agenda de "reuniões e reuniões e reuniões".
A produção de "Chicago" captou R$ 2,1 milhões pela Lei Rouanet (que autoriza destinar dinheiro de Imposto de Renda a projetos culturais). Os dados são do Ministério da Cultura (MinC), que autorizou a empresa a captar R$ 4,8 milhões para a produção.
Para obter a autorização, a CIE apresentou projeto em que estima público de "cem mil pessoas" e diz pretender "comercializar ingressos com valores variando entre R$ 200 e R$ 40". O menor valor cobrado pelo ingresso de "Chicago", em cartaz em São Paulo até dezembro, é R$ 55.
A CIE-Brasil ainda poderá captar os R$ 2,7 milhões restantes, porque a autorização do MinC só expira no último dia do ano.
Outra opção na cartela teatral de São Paulo, o espetáculo "Otelo" voltou ao cartaz no mês passado, no Galpão do Folias, com preço idêntico ao de sua estréia, em 2003: R$ 20.
O produtor Alexandre Brazil diz que é possível cobrar esse valor porque "o Folias é subsidiado com dinheiro público para a manutenção de seu espaço". O benefício recebido do programa municipal de fomento ao teatro, segundo Brazil, ajuda a viabilizar as montagens da casa. "Esse dinheiro paga o telefone, por exemplo. Como eu produziria sem ele?"


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