São Paulo, sexta-feira, 17 de outubro de 2008

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Festival em SP amplia fronteiras do teatro grotesco

Dez peças curtas que integram a programação passeiam por humor, escatologia e "exposição da mesquinharia'

Os espetáculos serão apresentados em esquema de rodízio, três por noite, no N.Ex.T, de sexta a domingo, até o dia 9 de novembro


LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL

O senso comum costuma associar o grotesco àquilo que se presta ao riso, à galhofa. Para ampliar o leque de acepções, o dramaturgo e diretor Antonio Rocco concebeu o Festival do Teatro Grotesco de São Paulo, cuja primeira edição começa hoje, no N.Ex.T (veja a programação no quadro à esquerda).
"Entendo o grotesco como o limite entre o homem e o animal, o ponto em que acaba a racionalidade e começa o instinto. É nessa zona indefinida, turva que ele mora, e é ela que tentaremos iluminar", explica ele.
Além do humor, essa "área de penumbra" abriga a escatologia e a "exposição do pior sentimento humano, da mesquinharia, da perversidade", nas palavras de Rocco.
As três facetas estão contempladas nos dez textos que serão encenados durante o festival -encomendados a Fernando Bonassi, Otavio Frias Filho, diretor de Redação da Folha, Pedro Vicente e Hugo Possolo, entre outros.
"Todo mundo tem um texto maldito, de experimentação, teste de limites, que seria difícil montar em qualquer teatro", diz Rocco. "E não há nada mais atual do que o grotesco, porque ele não tem forma própria, está em constante mudança. Assim também é nossa sociedade: nunca as coisas ficaram obsoletas tão rápido."
Os espetáculos serão apresentados de sexta a domingo, durante quatro semanas, em esquema de rodízio. A cada noite, o público verá três histórias (cada uma com duração entre dez e 30 minutos).

"Chocar é démodé"
No cardápio, há desde o surto de um quase famoso num programa de TV ("Antropofagia e Fagocitose", de Newton Cannito) até a adaptação de um conto sobre uma família de roceiros ("Nhola dos Anjos", de Mário Viana), passando pelo falatório movido a antidepressivos de uma mulher ("Helena Comprimida", de Sérgio Roveri).
Dionísio Neto, um dos dramaturgos convidados, saúda um colega de ofício em "Nelson Rodrigues, Meu Amor, Meu Amor, Meu Amor". Na trama, a Glorinha da peça "Perdoa-me por me Traíres" vai ao paraíso oferecer sua primeira menstruação ao dono da história.
"Pego todos os cacoetes dele, me aproprio de sua linguagem e faço uma espécie de sátira à la teatro de revista", diz Neto, para quem chocar "é meio cafona, démodé". "Não escrevi o texto com esse intuito. Quero provocar o riso em cima de uma situação grotesca."
Ao idealizar o festival, Rocco definiu o grotesco como aquilo que "dispensa o verniz social, causa um ruído indisfarçável". A livre circulação de idéias e discursos na internet e a derrubada sucessiva de tabus na cena pública ainda deixaram temas capazes de ruborizar a platéia?
"Por mais evoluídos que estejamos, ainda há resquícios de arquétipos apodrecidos", afirma o ator Ivan Capua, que está em cinco peças do festival -e divide o palco com outros oito intérpretes.
Já Neto avalia que "tudo foi dito, sim, mas há muitas maneiras de dizer as mesmas coisas de outras formas".

Aviso no prólogo
Para evitar que as tais "outras formas" de contar histórias causem desconforto excessivo em um ou outro desavisado da platéia, toda noite será aberta por um breve cabaré "didático".
Nesse prólogo, ambientado na Roma Antiga, serão apresentadas as três vertentes do grotesco, acompanhadas do aviso de que ainda é possível deixar a sala. Os que ficarem ouvirão um ambíguo "parabéns por sua coragem".


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