São Paulo, sexta-feira, 17 de novembro de 2000

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Escritor, que chegou à Shindo Renmei por causa de "Chatô", diz que não se candidata nem a síndico
"Biografar Vargas seria minha última obra"


ESPECIAL PARA A FOLHA

Leia a seguir os principais trechos da entrevista de Fernando Morais à Folha.
(CYNARA MENEZES)

Folha - É meio realismo mágico que os japoneses no Brasil acreditassem ter vencido a guerra, não?
Fernando Morais -
É muito Macondo. É incompreensível que 180, 200 mil pessoas se recusassem a acreditar num negócio tão transparente, tão cristalino. É como hoje você não acreditar que o homem não pisou na Lua, que foi uma armação.

Folha - O governo acabou contribuindo, com tantas proibições?
Morais -
Os japoneses não tinham nenhuma relação afetiva, cultural, e nem queriam ter, com o Brasil. Foram proibidos de ler jornais, de falar japonês, não falavam português, não podiam reunir em público mais de duas pessoas, não podiam ter rádio em casa, não tinham embaixada, não tinham consulado. Vem a Shindo Renmei e começa a fazer folhetos, boletins, jornal, falsificar a "Life", matar. Passou a ser a ligação da colônia com o mundo.

Folha - Como o sr. se deparou com a história da Shindo Renmei?
Morais -
Estava entrevistando uma senhora nissei que tinha sido namorada do Chatô quando adolescente e quis saber como a vida dela cruzou com a dele. Ela disse que foi uma casualidade, porque seu pai era da Shindo Renmei, foi preso, e o Chatô ajudou a soltar. Aquilo ficou na minha cabeça.

Folha - Quanto tempo tardou? Seus adiamentos já viraram história...
Morais -
"Chatô" levei sete anos, este só quatro, então estou aumentando o ritmo. Este teve uma desvantagem: não falo uma sílaba de japonês. Para ter uma idéia, havia uma ilustração que estava de cabeça para baixo. Mas a vantagem era a concentração geográfica, diferentemente de "Chatô" e de "Olga". Isso facilitou.

Folha - Por que seu interesse em livros ambientados na era Vargas?
Morais -
Tenho uma fascinação pelo período que vai da Proclamação da República até a Revolução de 30. Depois tem o período de 30 até 54, que é outro período muito rico. De lá para cá, meu interesse cai. Getúlio é um personagem fascinante, que não está devidamente revelado ainda. Se vier a fazer a biografia dele, terá que ser a última coisa da minha vida. É um trabalho para dez anos.

Folha - O sr. o admira?
Morais -
É evidente que pelo Getúlio do Estado Novo eu não posso ter a menor simpatia. Mas não posso deixar de admirar a figura que fez o que fez neste país. O Brasil tem hoje a cara que tem, era para ser muito pior, graças a Getúlio.

Folha - O sr. desistiu da política?
Morais -
Desisti de eleição. Eu não me candidato mais nem a síndico de prédio. É muita chatice, a possibilidade de fazer coisas efetivamente é pequena. Sou do PMDB, mas nem sei se sou mais. Um PMDB que tem o Jáder (Barbalho) presidente não é exatamente o PMDB dos meus sonhos. Sou PMDB por inércia.

Folha - Ou pelo Orestes Quércia?
Morais -
Sou amigo pessoal do Quércia, gosto dele, tenho uma relação boa com ele, mas passou. Hoje eu acho que tem gente que faz isso melhor que eu.

Folha - Daria o livro para filmar depois da história com "Chatô"?
Morais -
Não só teria coragem de dar este livro para filmar, como se o Guilherme Fontes me telefonasse aqui, agora, e fizesse uma boa proposta, eu venderia para o Guilherme. Ele pode ter cometido erros administrativos, por inexperiência. Dolo, desonestidade, estou absolutamente convencido de que não.

Folha - O sr. acha que a comunidade nipo-brasileira vai comprar o livro?
Morais -
Acho que vai comprar discretamente, como eles fazem sempre. E acho que vai gostar.


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