São Paulo, quinta-feira, 17 de novembro de 2005

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LIVRO

Obra vê capital do ponto de vista de seus habitantes

Alemanha publica retrato "nada chique" e humano de Brasília

EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL

Há 50 anos escolhia-se o lugar onde a nova capital do país viria a ser construída, no Planalto Central. Passados esses anos, Carmen Stephan, uma jornalista alemã, e Gleice Mere, uma fotógrafa brasiliense, publicam na Alemanha um livro que propõe uma visão da cidade para além de sua utopia arquitetônica e urbanística.
"Brasília Stories", que terá lançamento festivo na Embaixada Brasileira em Berlim em janeiro de 2006 (mas ainda sem editora no Brasil), reúne oito "retratos" da capital do país, uma combinação de fotos e textos que tenta revelar a cidade do ponto de vista de seus habitantes.
"Rio e São Paulo são bem conhecidos na Alemanha. Mas existe um interesse pela arquitetura e pela idéia utópica de Brasília. Para mim, no entanto, a cidade não é mais utopia. Brasília existe, é uma cidade moderna, tranqüila, bonita, com espaços grandes, que quase não se encontram mais. E também uma cidade com seus problemas fora do plano-piloto. Mas ela existe fora da "Wallpaper" e de outras revistas de design", afirma Stephan, responsável pelo ponto de vista alemão do livro.
"Gleice não gostava de ver que na Europa o retrato de Brasília fosse somente um retrato da arquitetura. Ninguém fala das pessoas, é como se ninguém morasse lá, como se fosse um planeta longe. Por isso suas fotografias não têm muito do chique que se conhece por aqui."
As histórias de "Brasília Stories" são divididas por temas, entre eles "construir Brasília", "crescer em Brasília" e "o corpo", introduzidos por Stephan num texto sobre "como chegar a Brasília".
A jornalista esteve pela primeira vez em Brasília como turista, em 2002, quando morava no Rio, e chegou a passar dois meses no escritório de Oscar Niemeyer, fazendo uma série de entrevistas.
"Fiquei muito impressionada. Nunca vi um lugar que parecia tão leve e ao mesmo tempo tão inacessível. Uma cidade atrás do vidro do carro, do vidro da janela do hotel. Achei fascinante e me perguntei: "Como se cresce aqui? Que influência a arquitetura tem nas pessoas? Como é a primeira geração de Brasília?'", lembra ela.
Separados então por temas, os personagens do livro fazem um retrato bem diverso da cidade. Estão lá pioneiros como o orgulhoso Raimundo Bento Araújo, pedreiro analfabeto que chegou a Brasília aos 15 anos para construir a cidade; a bailarina Eliana Carneiro, que descobriu uma nova relação com o corpo na cidade, e o artista plástico Milton Marques, que participou no ano passado da Bienal de São Paulo.
"Para ele, Brasília funciona como um laboratório, uma nova idéia ou possibilidade. Essa é uma vantagem da cidade para as pessoas que trabalham com arte: você precisa de criatividade em Brasília, ela não tem história, você faz a história", sustenta Stephan.
"Brasília Stories", no entanto, não é só um livro sobre brasilienses orgulhosos da cidade. "Tem também um homem idoso que se sente rejeitado pela cidade e guarda sentimentos muito ambivalentes em relação a Brasília. O livro mostra a arquitetura e o urbanismo refletidos nessas pessoas", arremata a jornalista.


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