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CRÍTICA
Atualização expõe moral de comédia romântica
CLAUDIO SZYNKIER
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Estamos no terreno do narcisismo, habitado por este Alfie, motorista de limusine metrossexual, mulherengo e irresistível.
Alérgico à idéia do convívio afetivo prolongado, seu cotidiano é
uma aventura hedonista. Não é
estranho então que essa refilmagem do sucesso inglês dos anos 60
parta de um pacote de imagens
narcisistas e hedonistas.
Há resíduos de um ar sessentista, representado por decorações e
por um frescor de movimentação
pelas ruas. Porém o que predomina é um idioma "fashion-artificialista", estilo sintético de rapidez e
fluidez que estabelece um conteúdo audiovisual modernizado e
embalado para a circulação.
Composições meio oníricas, que
brincam com batimento de câmera, divisão de tela e cores anabolizadas -procedimentos caros aos
comerciais- são abundantes.
Mas qual é a tese coordenada
nas engrenagens profundas do filme? Alfie não é outra coisa senão
vítima da imagem descartável de
seu tempo, 2004. Alma adulterada
por uma cultura de reprodução e
imposição de imagens de consumo, dessas que estão infiltradas e
estruturam o próprio filme, um
simulador "consciente" desse
plástico todo. E Alfie sofrerá em
uma jornada de humanização.
Amadurecerá e poderá ser salvo.
Mas há um paradoxo, que está
nesse caráter de remake. Ao lado
do senso de atualização, há uma
urgência, a de soar oportuno: decifrar o homem solteiro e urbano
que foi "fabricado" de 66 até aqui.
Compreender e tampar o buraco
cronológico entre os Alfies, em
nome de um "insight". O filme
trata Alfie como sintoma humano
de modernidade. Temos quase
um personagem de planilha. Um
padrão sem rosto, espectro representante do tédio, das contradições e do "estar perdido" de um
corte sofisticado de sua geração.
Nesse sentido, o filme lembra
muito algo como uma peça de
pesquisa de mercado. A ordem
seria: detectar e entender, como se
fosse para, depois, lançar produtos. Tendo-se em vista sempre o
fruto dessa operação, esse personagem global e ideal, que tem
dentro de si uma harmonização
entre certo cinismo e verdade humana superficial: uma química,
aliás, tão almejada pelo estatuto
da publicidade. O filme torna-se
mero reflexo, aparentemente involuntário, do universo cujos dispositivos seriam envenenadores.
Alfie - O Sedutor
Alfie
Direção: Charles Shyer
Produção: EUA/Inglaterra, 2004
Com: Jude Law, Marisa Tomei, Susan
Sarandon
Quando: a partir de hoje nos cines
Bristol, Jardim Sul, Tamboré e circuito
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