São Paulo, sábado, 18 de abril de 1998

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Marília Pêra revive Geni, a mulher que nunca foi menina

Atriz empresta corpoà personagem emblemática de"Toda Nudez Será Castigada", sua primeira encenação em uma peça de Nelson Rodrigues; dirigida por Moacyr Góes, a montagemestréia dia 7 de maio em São Paulo

Divulgação
A atriz Marília Pêra, que fará a Geni no teatro


ANNA LEE
da Sucursal do Rio

No ano em que comemora 50 anos de carreira, a atriz Marília Pêra, 55, resolveu corrigir o que considera ''uma falha'' em seu currículo, que inclui 42 prêmios, 32 peças de teatro, 14 filmes, 17 novelas e outros tantos shows, programas de televisão, discos e direções: vai encenar pela primei ra vez um texto de Nelson Rodri gues, ''Toda Nudez Será Castigada''.
A peça -dirigida por Moacyr Góes, que também pela primeira vez faz um texto do autor- estréia no dia 7 de maio, em São Paulo, no teatro Alfa, e chega ao Rio em 5 de junho, no teatro Carlos Gomes.
''Tenho várias falhas no meu currículo, diversos autores que eu adoro e nunca fiz, mas com o Nelson é diferente. Ele me é muito familiar para nunca ter feito nada dele'', disse Marília Pêra.
A atriz contou que, quando criança, seus pais, os atores Manoel Pêra e Dinorah Marzullo, iam trabalhar no teatro, à noite, e a deixavam na casa da avó. Para distraí-la, a avó lia "A Vida como Ela É...'', crônicas que Nelson Rodrigues publicava no ''Última Hora''. ''Ficava fascinada com as histórias, eram muito excitantes e engraçadas. Gostava do tipo de humor que ele usava, uma linguagem que eu entendia desde pequena.''
A opção por ''Toda Nudez'' foi sugestão do ator André Valli, "amigo de mais de 30 anos'', que também está no elenco da peça. Na peça, Geni se casa com o viúvo Herculano (Walter Breda), entra para uma família tradicional e passa a conviver com Serginho (Leon Góes), único filho do marido, com o cunhado Patrício (André Valli), seu antigo cliente que arranjou o casamento, e com três tias solteironas e castas.
As tias, interpretadas por Eliana Guttman, Maria do Carmo Soares e Helen Helene, segundo Góes, pontuam o espetáculo, exercendo função semelhante à de um coro. Serginho, revoltado com a união do pai com a prostituta, acaba se envolvendo com ela. O rapaz de 18 anos só se aproxima de Geni para se vingar do pai, que não se man teve fiel ao luto.
Mas Geni se apaixona por Serginho e, quando é abandonada por ele, que vai viver no exterior com um ladrão boliviano que o havia violentado na prisão, se mata. Marília contou que só aceitou fazer a personagem porque, durante a leitura da peça, percebeu que Geni ''é sobretudo engraçada'', o que, segundo ela, não foi explora do nas outras montagens que viu.
''É um pouco do meu temperamento buscar, por meio do patético dos personagens, o humor.'' A atriz disse que viu a primeira montagem de ''Toda Nudez'', de 1965, com Cleyde Yáconis (''Deu a impressão de ser uma coisa seríssima.''), e assistiu ao filme, dirigido por Arnaldo Jabor, em 1973, protagonizado por Darlene Glória ("Ela fez uma opção entre o trágico e o dramático.'').
''Percebi que eu não tinha que me preocupar em fazer a Geni dez anos mais jovem do que eu. Descobri que na verdade ela tem 11 anos. Emocionalmente ela não saiu da infância, isso faz com que seja muito engraçada. Minha construção da personagem está toda em cima dessa idéia.''
De qualquer forma, ''para dar mais veracidade ao papel'', resolveu clarear o cabelo, o que deu à atriz uma aparência mais jovem. Góes disse que, no início do texto, Geni fala que nunca foi menina e que ele transformou isso no eixo da montagem. ''Dá para perceber que a Geni é uma personagem que nunca conseguiu ser nada. Na ver dade, Nelson diz com isso que a mulher que nunca foi menina está condenada a ser menina para sempre. Essa foi a intuição que a Marília teve e que permitiu que ela construísse uma Geni engraçada, sem sair uma linha do original.''



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